quinta-feira, 17 de março de 2022

Texto para resumo Vicente 11A


Quadro: Albert Bierstadt, Tempestade na montanha 


“É natural que procuremos encontrar um padrão do gosto, uma regra capaz de conciliar as várias opiniões dos homens; ou pelo menos uma decisão reconhecida, aprovando uma opinião e condenando outra.

Há uma espécie de filosofia que condena qualquer esperança de sucesso nessa tentativa, concluindo pela impossibilidade de vir jamais a atingir qualquer padrão de gosto. Diz ela que há uma diferença muito grande entre o juízo e o sentimento. O sentimento está sempre certo –porque o sentimento não tem outro referente senão ele mesmo e é sempre real, quando alguém tem consciência dele. Mas nem todas as determinações do entendimento são certas, porque têm como referente algumas coisas para além delas mesmas, a saber, os factos reais e nem sempre são conformes a esse padrão. Entre mil e uma opiniões que pessoas diferentes podem ter a respeito do mesmo assunto, há uma e apenas uma que é justa e verdadeira e a única dificuldade é encontrá-la e confirmá-la. Pelo contrário, os mil e um sentimentos despertados pelo mesmo objeto são todos certos, porque nenhum sentimento representa o que realmente está no objeto. Ele limita-se a observar uma certa conformidade ou relação entre o objeto e os órgãos ou faculdades do espírito e, se essa conformidade realmente não existisse, o sentimento jamais poderia ter ocorrido. A beleza não é uma qualidade das próprias coisas, existe apenas no espírito que a contempla e cada espírito percebe uma beleza diferente. É possível até uma pessoa encontrar deformidade onde uma outra vê apenas beleza e qualquer indivíduo deve concordar com o seu próprio sentimento, sem ter a pretensão de regular o dos outros. Procurar estabelecer uma beleza real ou uma deformidade real é uma investigação tão infrutífera como procurar uma doçura real ou um amargor real. Conforme a disposição dos órgãos do corpo, o mesmo objeto tanto pode ser doce ou amargo e o provérbio popular afirma, com muita razão, que gostos não se discutem. É muito natural e mesmo absolutamente necessário aplicar este axioma ao gosto mental, além do gosto corpóreo e assim o senso comum, que tão frequentemente diverge da filosofia, neste caso, está de acordo com esta decisão.

David Hume, Do padrão de gosto

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