sábado, 3 de outubro de 2015

Lógica. Argumentos Dedutivos e não-dedutivos.Validade e verdade.

Argumentos dedutivos e argumentos não-dedutivos


Critérios de avaliação
Embora um argumento possa ter diferentes objectivos, o seu propósito fundamental é, habitualmente, demonstrar que uma conclusão é verdadeira ou, ao menos, provavelmente verdadeira. Assim, os argumentos podem ser avaliados e considerados melhores ou piores na medida em que cumprem ou deixam de cumprir este propósito. Examinaremos, de seguida, quatro critérios para fazer essa avaliação:

1) São todas as premissas verdadeiras?
2) É a conclusão ao menos provável, dada a verdade das premissas?
3) São as premissas relevantes para a verdade da conclusão?
4) É a conclusão vulnerável a nova evidência?

Nem todos estes critérios são aplicáveis a todos os argumentos. Se, por exemplo, um argumento pretende apenas mostrar que determinada conclusão se segue de um determinado conjunto de premissas, sejam ou não essas premissas verdadeiras, então o critério 1 é inaplicável; e, conforme o caso, os critérios 3 e 4 podem também ser inaplicáveis. Neste momento, porém, preocupar-nos-emos com o caso mais comum em que é propósito de um argumento estabelecer que a sua conclusão é, de facto, verdadeira ou provavelmente verdadeira.


Verdade das premissasO critério 1 não é, por si só, adequado para a avaliação de argumentos; mas fornece um bom ponto de partida: não importa quão bom um argumento possa ser, não poderá estabelecer a verdade da sua conclusão se alguma das suas premissas for falsa.
Avaliemos o seguinte argumento quanto ao critério 1:

“Dado que hoje em dia todos os americanos são isolacionistas, a história registará que, no início do século XXI, os Estados Unidos falharam como defensores da democracia mundial.”

A premissa ‘Hoje em dia todos os americanos são isolacionistas’ é indubitavelmente falsa; logo, o argumento não estabelece que os Estados Unidos irão falhar como defensores da democracia mundial. Isto não significa, evidentemente, que a conclusão é falsa; significa, sim, que o argumento é inútil quanto a determinar a sua verdade ou falsidade.

Frequentemente, a verdade ou falsidade de uma ou mais premissas é desconhecida; e, assim, o argumento falha em estabelecer a sua conclusão tanto quanto sabemos. Em tais casos, falta-nos informação suficiente para aplicarmos com segurança o critério 1, e poderemos ter necessidade de suspender o juízo até que informação adicional esteja disponível.
Avaliemos o seguinte argumento quanto ao critério 1:

“Há muitas civilizações extraterrestres avançadas na nossa galáxia. Muitas dessas civilizações geram sinais electromagnéticos suficientemente poderosos para serem detectados na Terra. Logo, temos a possibilidade de detectar sinais gerados por civilizações extraterrestres.”

Ainda não sabemos se as premissas deste argumento são ou não verdadeiras. Não podemos, portanto, fazer melhor do que suspender o juízo até que disponhamos de meios para determinar com segurança a verdade ou a falsidade das premissas. este argumento não convenceria fosse quem fosse da verdade da sua conclusão — pelo menos, não neste momento.

O critério 1 apenas requer que as premissas sejam verdadeiras; mas, na prática, um argumento só comunica a verdade da sua conclusão se as pessoas a quem se dirige souberem que as suas premissas são verdadeiras. Se um argumentador sabe que as suas premissas são verdadeiras mas as pessoas a quem se dirige não, então, de modo a provar-lhes que a sua conclusão é verdadeira, o argumentador deve fornecer argumentos adicionais, a fim de estabelecer a verdade das premissas.
Suponhamos que o vidro de uma janela se quebrou. Uma garotinha apresenta o seguinte argumento:

“O Ricardo partiu o vidro. Eu vi-o.”Se formularmos o argumento na representação canónica, teremos:

Eu vi o Ricardo partir o vidro.
Logo, o Ricardo partiu o vidro.
Suponhamos que temos razões para acreditar que a criança não viu tal coisa. Se avaliarmos o argumento segundo o critério 1, veremos que, ainda que a criança esteja a dizer a verdade, o seu argumento falha em estabelecer a sua conclusão para nós, pelo menos enquanto não soubermos que a sua premissa é verdadeira. O melhor que teríamos a fazer, no momento, seria suspender o juízo e procurar nova evidência.

Outra limitação ao critério 1 é que a verdade das premissas — ou o facto de serem conhecidas como verdadeiras — não basta para garantir que a conclusão é verdadeira. A verdade das premissas é uma condição necessária, mas não suficiente, para estabelecer a verdade da conclusão. Num bom argumento, as premissas devem ainda sustentar a conclusão.
Avalie-se o seguinte argumento quanto ao critério 1:

“Todos os assassinos matam. Logo, os soldados que matam, na batalha, são assassinos.”
Dado que a premissa é verdadeira, o argumento satisfaz o critério 1. No entanto, falha em estabelecer a conclusão, porque a premissa deixa em aberto a possibilidade de algumas pessoas que matam não serem assassinas. Talvez seja esse o caso dos soldados, na batalha; a premissa, pelo menos, não fornece qualquer boa razão para se pensar que não é. Assim, a premissa, embora verdadeira, não sustenta adequadamente a conclusão. O argumento nada prova.

Estes exemplos demonstram a necessidade de estabelecer critérios adicionais para a avaliação de argumentos, critérios para avaliar o grau em que um conjunto de premissas fornece evidência a favor de uma conclusão. Há, a este respeito, dois parâmetros principais que se devem ter em conta. Um é probabilístico: a conclusão pode ser mais ou menos provável, dadas as premissas. O outro parâmetro é a relevância das premissas relativamente à conclusão. Estes dois parâmetros são, respectivamente, o objecto dos nossos dois critérios de avaliação seguintes.


Validade e probabilidade indutivaO critério 2 avalia os argumentos relativamente à probabilidade da conclusão, dada a verdade das premissas. A este respeito, os argumentos podem ser classificados em duas categorias: dedutivos e indutivos.
Um argumento dedutivo é uma argumento cuja validade ou invalidade pode ser explicada pela sua forma lógica, exclusivamente. Se for válido, então a sua conclusão segue-se necessariamente das suas premissas básicas. (Salvo especificação em contrário, usaremos o termo ‘dedutivo’ como sinónimo de ‘dedutivamente válido’.) Mais precisamente, um argumento é dedutivo se é impossível ter todas as premissas básicas verdadeiras e conclusão falsa. Um argumento indutivo, por contraste, é um argumento cuja conclusão não se segue necessariamente das suas premissas: há uma certa probabilidade que a conclusão seja verdadeira se as premissas o são, mas há também a probabilidade que seja falsa.
A probabilidade de uma conclusão, dado um conjunto de premissas, é chamada ‘probabilidade indutiva’. A probabilidade indutiva de um argumento dedutivo é máxima; isto é, é igual a 1 (a probabilidade é habitualmente medida numa escala de 0 a 1). A probabilidade indutiva de um argumento indutivo é tipicamente (porventura sempre) menor do que 1.
Eis dois exemplos de argumentos dedutivos:

Nenhum mortal pode deter o passar do tempo. Você é mortal. Logo, você não pode deter o passar do tempo.”

“Alguns porcos têm asas. Tudo o que tem assas canta. Logo, alguns porcos cantam.”

Os dois argumentos a seguir apresentados são indutivos:

“Não há evidência segura de terem existido seres humanos com mais de 3 metros de atura. Logo, nunca houve humanos com mais de 3 metros de altura.”

“Quimicamente, o cloreto de potássio é muito semelhante ao sal de mesa. Logo, o cloreto de potássio sabe como o sal de mesa.”

Estes exemplos ilustram o facto de que a validade dedutiva e a validade indutiva são independentes da verdade efectiva das premissas e da conclusão. Logo, o critério 2 é independente do critério 1 e não é, por si só, adequado para a avaliação de argumentos. Note-se, por exemplo, que os dois argumentos dedutivos apresentados exibem combinações diferentes de verdade e falsidade. As premissas e a conclusão do primeiro são todas verdadeiras, ao passo que todas as afirmações que figuram no segundo são falsas. Qualquer combinação de verdade e falsidade é possível, seja num argumento dedutivo seja num argumento indutivo, excepto que nenhum argumento dedutivo (válido) pode, por definição, ter todas as premissas verdadeiras e conclusão falsa.

Um argumento dedutivo (válido) cujas premissas básicas são todas verdadeiras diz-se ‘sólido’. Um argumento sólido estabelece com certeza que a sua conclusão é verdadeira.
O argumento seguinte é sólido (é dedutivamente válido e as suas premissas são verdadeiras):

Toda a gente tem um e um só pai biológico. Os irmãos verdadeiros têm o mesmo pai biológico. Ninguém é o seu próprio pai biológico. Logo, não há qualquer pessoa cujo pai biológico seja também seu irmão verdadeiro.”
Note-se que quando dizemos que num argumento dedutivo (válido) é impossível todas as premissas serem verdadeiras e a conclusão falsa, o termo ‘impossível’ deve ser entendido num sentido muito forte. Significa não apenas “impossível na pratica” mas “logicamente impossível”; isto é, impossível na sua própria concepção.
A distinção é ilustrada pelo seguinte exemplo:

“A Susana lê o Wall Street Journal. Logo, a Susana tem mais de 3 meses de idade.”

Apesar de ser impossível na prática alguém que não tem mais de 3 meses de idade ler o Wall Street Journal, isso é, ainda assim, coerentemente concebível; a ideia em si mesma não envolve qualquer contradição. É, assim, logicamente possível (embora praticamente impossível) a conclusão ser falsa e a premissa verdadeira. Por outras palavras, a conclusão, ainda que altamente provável, não se segue necessariamente da premissa. Logo, o argumento não é dedutivo (não dedutivamente válido).
Por outro lado, o argumento pode ser transformado num argumento dedutivo mediante a adição de uma premissa:

Todos os leitores do Wall Street Journal têm mais de 3 meses de idade. A Susana lê o Wall Street Journal. Logo, a Susana tem mais de 3 meses de idade.”Deste modo, não é só praticamente impossível as premissas serem verdadeiras e a conclusão falsa: é logicamente impossível. Este novo argumento é, pois, dedutivo.
Nem sempre é óbvio se um argumento determinado é ou não dedutivo

 Trad. e adapt. de Nolt, John, et al., 1988, Schaum’s Outline of Theory and Problems of Logic, New York, McGraw-Hill, 1998.

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