Quadro: Albert Bierstadt, Tempestade na montanha
“É natural que procuremos encontrar um padrão do gosto, uma
regra capaz de conciliar as várias opiniões dos homens; ou pelo menos uma
decisão reconhecida, aprovando uma opinião e condenando outra.
Há uma espécie de filosofia que condena qualquer esperança de sucesso nessa
tentativa, concluindo pela impossibilidade de vir jamais a atingir qualquer
padrão de gosto. Diz ela que há uma diferença muito grande entre o juízo e o
sentimento. O sentimento está sempre certo –porque o sentimento não tem outro
referente senão ele mesmo e é sempre real, quando alguém tem consciência dele.
Mas nem todas as determinações do entendimento são certas, porque têm como
referente algumas coisas para além delas mesmas, a saber, os factos reais e nem
sempre são conformes a esse padrão. Entre mil e uma opiniões que pessoas
diferentes podem ter a respeito do mesmo assunto, há uma e apenas uma que é
justa e verdadeira e a única dificuldade é encontrá-la e confirmá-la. Pelo
contrário, os mil e um sentimentos despertados pelo mesmo objeto são todos
certos, porque nenhum sentimento representa o que realmente está no objeto. Ele
limita-se a observar uma certa conformidade ou relação entre o objeto e os
órgãos ou faculdades do espírito e, se essa conformidade realmente não
existisse, o sentimento jamais poderia ter ocorrido. A beleza não é uma qualidade
das próprias coisas, existe apenas no espírito que a contempla e cada espírito
percebe uma beleza diferente. É possível até uma pessoa encontrar deformidade
onde uma outra vê apenas beleza e qualquer indivíduo deve concordar com o seu
próprio sentimento, sem ter a pretensão de regular o dos outros. Procurar
estabelecer uma beleza real ou uma deformidade real é uma investigação tão
infrutífera como procurar uma doçura real ou um amargor real. Conforme a
disposição dos órgãos do corpo, o mesmo objeto tanto pode ser doce ou amargo e
o provérbio popular afirma, com muita razão, que gostos não se discutem. É
muito natural e mesmo absolutamente necessário aplicar este axioma ao gosto
mental, além do gosto corpóreo e assim o senso comum, que tão frequentemente diverge
da filosofia, neste caso, está de acordo com esta decisão.
David Hume, Do padrão de gosto
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