De acordo com Descartes, a primeira coisa que se sabe [sabendo-se que a base do conhecimento não pode ser a experiência dos sentidos] é, pelo menos, que você existe. Como? Bem, é que mesmo que esteja neste momento a sonhar, que seja um cérebro numa cuba ou a vítima de um espírito maligno enganador, você tem, antes de mais, de existir para poder estar a sonhar ou ser enganado. Com efeito, para estar preocupado com a questão de saber se está ou não está a sonhar, para estar preocupado com a questão de saber se existe tal demónio ou mesmo se você realmente existe, você tem de existir para poder ter tais preocupações. Se não existisse de todo, não se poderia obviamente preocupar com esse facto. Assim, só o facto de pensar sobre a sua existência é suficiente para provar que existe. “Cogito, ergo sum”, como diz Descartes – “Penso, logo existo.” Este argumento famoso, de que se pode ter conhecimento sem termos de nos apoiar na fiabilidade dos sentidos é, na perspetiva de Descartes, o ponto de partida de todo o conhecimento e o que faz parar em absoluto toda a dúvida: você pode não saber outra coisa, mas pode ao menos saber de certeza que é real.
Até aqui tudo bem. Mas há algo mais que seja real? Em particular, é real o universo físico que você sempre acreditou existir fora da sua mente – o mundo habitual, das mesas, cadeiras, pedras, árvores, dos outros seres humanos, cães, gatos e outros animais, planetas, estrelas e galáxias – é tudo isso real? Dá a sensação de que se todas as experiências percetivas podem ser falsas, então não há, nem pode haver, forma de saber se algo mais existe. Talvez nada mais exista de facto – nem sequer um espírito malévolo ou cientistas loucos. Talvez você seja a única realidade, constituindo as suas experiências percetivas nada mais do que uma alucinação que dura indefinidamente e o universo inteiro um produto da sua imaginação. Isto é o solipsismo: a perspetiva segundo a qual “apenas eu existo”.
Edward Feser, Philosophy of mind. A beginner’s guide. (Oxford, 2006). Trad. Carlos Marques.
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