(...) É antes de mais, necessário deixar de considerar (a arte) um meio para o prazer e considerá-la uma das condições da vida humana. Vista deste modo, é impossível deixar de reparar que a arte é um dos meios das pessoas se relacionarem.
Toda a arte faz aquele que a aprecia entrar num certo tipo
de relação, quer com aquele que a produziu ou está produzindo, quer com todos
aqueles que simultânea, prévia ou posteriormente, recebem a mesma impressão
artística.
Tal como as palavras, que ao transmitir pensamentos e
experiências das pessoas, servem como um meio de união entre elas, também a
arte atua de forma semelhante. A particularidade desta última forma de
relacionamento, e que a distingue do tipo de relacionamento por meio de
palavras, consiste nisto: enquanto por meio de palavras uma pessoa transmite a
outra os seus pensamentos, pela arte transmite as suas emoções.
(...)
A arte é uma atividade humana que consiste nisto: em uma
pessoa conscientemente, por intermédio de certos sinais externos, levar a outras
pessoas a sentimentos de que teve experiência e que estas sejam contagiadas por
tais sentimentos e deles também tenham experiência.
A arte não é, como os metafísicos dizem, a manifestação de
alguma ideia misteriosa de belo ou de Deus ; não é, como os psicólogos
estéticos dizem, um jogo que serve para descarregar o excesso de energia
acumulada; não é apenas a expressão das emoções de uma pessoa através de sinais
externos; não é a produção de objetos que agradem; e acima de tudo, não é
prazer; mas é um meio de união entre pessoas, unindo-as nos mesmo sentimentos,
indispensável à vida e ao progresso em direção ao bem-estar dos indivíduos e da
humanidade. (…)
Os sentimentos com
que o artista contagia os outros podem ser os mais variados -muito fortes ou
muito fracos, muito importantes ou muito insignificantes, muito maus ou muito
bons: sentimentos de amor pelo seu próprio país, de entrega e submissão ao
destino ou a Deus expressos numa peça dramática, arrebatamentos de amantes
descritos numa novela, sentimentos de volúpia expressos num quadro, coragem
expressa numa marcha triunfal, felicidade evocada numa dança, humor evocado
numa história divertida, o sentimento de serenidade transmitido por uma
paisagem ou por uma canção de embalar, ou o sentimento de admiração evocado por
um belo arabesco - tudo isso é arte.
Desde que os
espectadores ou ouvintes sejam contagiados pelos mesmos sentimentos que o autor
sentiu, há arte."
Leão Tolstoi, O que é a Arte.Leão Tolstoi, O que é a arte?
Tradução de Aires de
Almeida
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