1. Indução
Uma linha de resposta
bastante diferente para o problema da indução deve-se a Karl Popper. Popper
olha para a prática da ciência para nos mostrar como lidar com o problema.
Segundo o ponto de vista de Popper, para começar a ciência não se baseia na
indução. Popper nega que os cientistas começam com observações e inferem depois
uma teoria geral. Em vez disso, primeiro propõem uma teoria, apresentando-a
como uma conjetura inicialmente não corroborada, e depois comparam as suas
previsões com observações para ver se ela resiste aos testes. Se esses testes
se mostrarem negativos, então a teoria será experimentalmente falsificada e os
cientistas irão procurar uma nova alternativa. Se, pelo contrário, os testes
estiverem de acordo com a teoria, então os cientistas continuarão a mantê-la
não como uma verdade provada, é certo, mas ainda assim como uma conjetura não
refutada.
Se olharmos para a ciência
desta maneira, defende Popper, então veremos que ela não precisa da indução.
Segundo Popper, as inferências que interessam para a ciência são refutações,
que tomam uma previsão falhada como premissa e concluem que a teoria que está
por detrás da previsão é falsa. Estas inferências não são indutivas, mas
dedutivas. Vemos que um A é não-B, e concluímos que não é o caso que todos os
As são Bs. Aqui não há hipótese de a premissa ser verdadeira e a conclusão
falsa. Se descobrirmos que um certo pedaço de sódio não fica laranja quando é
aquecido, então sabemos de certeza que não é o caso que todo o sódio aquecido
fica laranja. Aqui o facto interessante é que é muito mais fácil refutar
teorias do que prová-las. Um único exemplo contrário é suficiente para uma
refutação conclusiva, mas nenhum número de exemplos favoráveis constituirá uma
prova conclusiva.
2. Falsificabilidade
Assim, segundo Popper, a
ciência é uma sequência de conjeturas. As teorias científicas são propostas
como hipóteses, e são substituídas por novas hipóteses quando são falsificadas.
No entanto, esta maneira de ver a ciência suscita uma questão óbvia: se as
teorias científicas são sempre conjeturais, então o que torna a ciência melhor
do que a astrologia, a adoração de espíritos ou qualquer outra forma de
superstição sem fundamento? Um não-popperiano responderia a esta questão
dizendo que a verdadeira ciência prova aquilo que afirma, enquanto que a
superstição consiste apenas em palpites. Mas, segundo a conceção de Popper,
mesmo as teorias científicas são palpites — pois não podem ser provadas pelas
observações: são apenas conjeturas não refutadas.
Popper chama a isto o
"problema da demarcação" — qual é a diferença entre a ciência e
outras formas de crença? A sua resposta é que a ciência, ao contrário da
superstição, pelo menos é falsificável, mesmo que não possa ser provada. As
teorias científicas estão formuladas em termos precisos, e por isso conduzem a
previsões definidas. As leis de Newton, por exemplo, dizem-nos exatamente onde
certos planetas aparecerão em certos momentos. E isto significa que, se tais
previsões fracassarem, poderemos ter a certeza de que a teoria que está por
detrás delas é falsa. Pelo contrário, os sistemas de crenças como a astrologia
são irremediavelmente vagos, de tal maneira que se torna impossível mostrar que
estão claramente errados. A astrologia pode prever que os escorpiões irão
prosperar nas suas relações pessoais à quinta-feira, mas, quando são
confrontados com um escorpião cuja mulher o abandonou numa quinta-feira, é
natural que os defensores da astrologia respondam que, considerando todas as
coisas, o fim do casamento provavelmente acabou por ser melhor. Por causa
disto, nada forçará alguma vez os astrólogos a admitir que a sua teoria está
errada. A teoria apresenta-se em termos tão imprecisos que nenhumas observações
atuais poderão falsificá-la.
3. Ciência e pseudociência
O próprio Popper usa este
critério de falsificabilidade para distinguir a ciência genuína não só de
sistemas de crenças tradicionais, como a astrologia e a adoração de espíritos,
mas também do marxismo, da psicanálise de várias outras disciplinas modernas
que ele considera negativamente como "pseudociências". Segundo
Popper, as teses centrais dessas teorias são tão irrefutáveis como as da
astrologia. Os marxistas preveem que as revoluções proletárias serão bem
sucedidas quando os regimes capitalistas estiverem suficientemente
enfraquecidos pelas suas contradições internas. Mas, quando são confrontados
com revoluções proletárias fracassadas, respondem simplesmente que as
contradições desses regimes capitalistas particulares ainda não os
enfraqueceram suficientemente. De maneira semelhante, os teóricos psicanalistas
defendem que todas as neuroses adultas se devem a traumas de infância, mas
quando são confrontados com adultos perturbados que aparentemente tiveram uma
infância normal dizem que ainda assim esses adultos tiveram que atravessar
traumas psicológicos privados quando eram novos. Para Popper, estes truques são
a antítese da seriedade científica. Os cientistas genuínos dirão de antemão que
descobertas observacionais os fariam mudar de ideias, e abandonarão as suas
teorias se essas descobertas se realizarem. Mas os teóricos marxistas e
psicanalistas apresentam as suas ideias de tal maneira, defende Popper, que
nenhumas observações possíveis os farão alguma vez modificar o seu pensamento.
David Papineau"Methodology"
em A. C. Grayling (org.), Philosophy: A Guide Through the Subject, Oxford
University Press, 1998
1. O que se entende por critério de demarcação e qual é o critério proposto por Popper?
2. Que método é aquele que explica melhor a lógica das teorias científicas?
3. A ciência não é indutiva para Popper. Porquê?
RESPOSTA ÀS QUESTÕES:
1. O critério de demarcação
pretende distinguir as ciências das “pseudociências”. Se todo o nosso
conhecimento, tanto o científico como os dogmas religiosos e os palpites
astrológicos, são apenas conjeturas, isto é, hipóteses de explicação e
compreensão do mundo, então qual a diferença entre o conhecimento científico e
os dogmas religiosos ou as “pseudociências”? É que contrariamente a estes conhecimentos,
as teorias científicas estão abertas à refutação e à falsificação pela
experiência podendo, por isso, ser modificadas e corrigidas; os dogmas, pelo
contrário, são tomados como verdades eternas que não são discutíveis e as
teorias astrológicas são tão vagas e imprecisas que seja qual for a previsão
que façam nunca se veem obrigadas a modificar as teorias mesmo que as previsões
se revelem falsas pois encontram sempre forma de as interpretar à luz das
teorias, não podendo, por isso, ser
falsificadas pela experiência.
2. O método que se adequa à
lógica científica é o de conjeturas e refutações. Cada teria representa uma
tentativa de resolução de um ou vários problemas Conjetura é uma suposição
validada por experiências, não é uma certeza ou verdade. As teorias científicas
são hipóteses explicativas que foram provisoriamente corroboradas pela
experiência, isto é, que ainda não foram falsificadas ou refutadas. Assim a
ciência funciona com um conjunto de conjeturas, que podem ser futuramente
refutadas. Para Popper, a ciência evolui no sentido de uma aproximação à
verdade na medida em que vai eliminando os erros das teorias, substituindo-as
por outras mais abrangentes e consistentes com os factos observados. A
inferência que os cientistas fazem é dedutiva a partir de um caso de uma
previsão falhada. Tipo: Modus Tollens,
uma dedução condicional.
Se todos os
corpos dilatam com o calor, e o tungstato de zircônio é um corpo, então dilata
com o calor
O tungstato de zircônio não dilatou com o calor
Então nem todos os corpos dilata com o calor.
3. Popper refuta esta teoria
e defende que a indução não é o método que permite a constituição das leis
científicas. Primeiro; porque nenhuma observação se faz sem antes ter um
problema teórico e, segundo; porque as leis são universais e necessárias,
enquanto a conclusão de um raciocínio indutivo é sempre provável.
Embora seja um procedimento
comum a algumas ciências como a Biologia, o método indutivo não permite a
construção de leis universais e necessárias, só permite leis probabilísticas.
Se há leis universais e necessárias em ciência, então, das duas uma, ou não são
científicas, pois não são resultados de generalizações a partir de observações
particulares, ou são científicas mas não são indutivas, são antes resultado de
um método diferente: Hipotético/Dedutivo.
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