quinta-feira, 16 de outubro de 2025

Texto para resumo Sofia 11A


O ponto de vista dominante da filosofia ocidental nos últimos trezentos anos tem sido o que derivou do filósofo francês René Descartes, um dos filósofos mais influentes de todos os tempos. O seu método consiste em olhar para um problema questionando o modo como um indivíduo adquire conhecimento. […]
O trabalho mais conhecido de Descartes, o Discurso do Método – o seu título completo é Discurso do Método Para Conduzir Adequadamente a Razão e Procurar a Verdade nas Ciências – está escrito num estilo atraente e claro. Pode parecer que aquilo que ele escreveu é mais simples e mais óbvio do que é na realidade, por isso temos de considerar aquilo que ele escreveu de modo cuidadoso. Eis uma passagem da quarta parte do Discurso do Método, publicado em 1637, na qual ele define de modo muito claro a sua perspectiva acerca da natureza do seu próprio eu (self):
“Então, examinando atentamente aquilo que eu era e vendo que poderia presumir que não possuía corpo e que não havia mundo nem nenhum local onde eu estivesse, mas não poderia fingir que eu não existia; e que, pelo contrário, pelo facto de estar a duvidar da verdade de outras coisas, seguia-se com bastante evidência e certeza que eu existia; ao passo que se eu tivesse parado de pensar, embora tudo o que eu sempre pensei ser verdadeiro o fosse, eu não tinha razão para acreditar que eu existia; eu soube a partir disto que eu era uma substância cuja essência ou natureza era apenas o pensamento….”
Esta passagem contém praticamente todos os componentes centrais da filosofia da mente de Descartes. Em primeiro lugar, Descartes é um dualista. Isto significa acreditar que a mente e o corpo são duas espécies de coisas bastante distintas, dois tipos do que ele chama “substância”. Em segundo lugar, aquilo que ele pensa que tu és, o teu eu, é a mente. Dado que tu és uma mente, e as mentes são totalmente independentes do corpo, tu podes mesmo assim existir, sem um corpo. Em terceiro lugar, a tua mente e os teus pensamentos são aquilo que tu conheces melhor. Para Descartes é possível, pelo menos em princípio, existir uma mente sem um corpo, sendo incapaz, por mais que tente, de se aperceber de outras coisas, incluindo outras mentes. Descartes sabia, como é óbvio, que o modo como tomamos conhecimento daquilo que se passa na mente de outras pessoas é pela observação da fala e das acções de “outros corpos”. Mas para ele havia duas possibilidades sérias capazes de pôr em causa a nossa crença na existência de outras mentes. Uma é que os outros corpos podem ser apenas fingimentos da nossa imaginação. A outra é que, mesmo que os corpos e as outras coisas materiais existam, as provas que normalmente pensamos que justificam a nossa crença que os outros corpos são habitados por mentes pode ter sido produzida por autómatos, por máquinas sem mentes. Em quarto lugar, a essência da mente é ter pensamentos, e por “pensamentos” Descartes significa algo de que te apercebes na tua mente quando estás consciente. (A essência de um tipo de coisa, K, é a propriedade – ou o conjunto de propriedades – cuja posse é uma condição necessária e suficiente para ser um membro de K. Ou seja, se algo tem a propriedade essencial E, então pertence a K – portanto E é uma condição suficiente para pertencer a K; tudo o que não tem E, não pertence a K – portanto E é necessário para a relação de pertença.) Noutras passagens Descartes diz que a essência de uma coisa material – a propriedade, por outras palavras, que toda a coisa material tem que ter – é ocupar espaço. Isto significa que para Descartes as duas diferenças essenciais entre coisas materiais e mentes são (1) que as mentes pensam, enquanto a matéria não pensa, e (2) que as coisas materiais ocupam espaço, enquanto as mentes não. A tese de Descartes é, assim, que aquilo que distingue a mente do corpo é o facto negativo que a mente não existe no espaço e o facto positivo que as mentes pensam. Não é surpreendente que Descartes tenha pensado que a matéria não pensa. Poucas pessoas supuseram que as mesas ou os átomos têm pensamentos. Mas porque é que ele pensou que as mentes não existem no espaço?

Kwame Anthony Appiah,Thinking it Through: An introduction to contemporary philosophy, Oxford University Press


segunda-feira, 13 de outubro de 2025

Texto para resumo Rebeca 11A

 


Os argumentos dos céticos

"O ceticismo, na sua versão mais extrema, é a ideia de que o conhecimento não é possível. Os céticos podem apresentar o seguinte argumento a favor da sua posição:

Se S sabe que P, então não é possível que S esteja enganado acerca de P.
É possível que S esteja enganado acerca de P.
Portanto, S não sabe que P.

Este argumento é um modus tollens e tem, por isso, forma válida. Se as premissas forem verdadeiras, o argumento é sólido e a conclusão verdadeira. A primeira premissa é meramente a expressão da condição que uma proposição tem de estar justificada de modo a garantir a sua verdade para que possa ser conhecimento. Admitamos, por isso, que é verdadeira. E a segunda? Como prova o cético esta premissa? É possível defendê-la apelando, por exemplo, aos erros e ilusões dos sentidos ou às limitações da memória e da razão. Mas também é possível defendê-la com um argumento mais geral que vise mostrar que nunca podemos justificar as nossas crenças e, portanto, que é sempre possível que estejamos enganados acerca delas.

Para vermos como, pensemos numa qualquer afirmação de cuja verdade julguemos estar absolutamente certos, como, por exemplo, que “A Lua é o único satélite natural da Terra”, ou que “Portugal situa-se na Europa”. A questão crucial é esta: que justificação temos para estarmos certos da sua verdade? Temos de ter uma justificação, claro. Caso contrário essas crenças não constituem conhecimento. Podemos justificar as nossas crenças dizendo, por exemplo, que as aprendemos na escola com os nossos professores de Geografia ou de Ciências da Natureza, que, dada a sua formação, são especialistas no assunto. O que fizemos, deste modo, foi justificar uma crença com outra crença. Mas isto, como é óbvio, levanta uma outra questão: que justificação temos para esta nova crença? Esta crença está, afinal de contas, numa posição similar à primeira. Se essa precisa de uma justificação, porque sem ela não constitui conhecimento, o mesmo se passa com esta. E, evidentemente, se esta não constitui conhecimento, também não pode justificar a primeira. Uma forma de justificar esta segunda crença é, claro, recorrer a uma outra da qual ela possa derivar. É fácil ver, no entanto, que o mesmo problema se colocará em relação a essa nova crença. Também ela precisará de uma justificação. Cada afirmação precisa de uma justificação e a justificação de uma nova justificação, numa regressão sem fim. Desse modo, parece, nem a primeira nem qualquer das outras crenças está justificada.

Há alguma forma de evitar esta consequência? Uma possibilidade é parar numa dada crença e não recuar mais na cadeia das justificações, deixando essa crença sem qualquer justificação. A outra é recuar nas nossas justificações até, eventualmente, voltarmos a uma crença que já usámos como justificação, raciocinando em círculo. Por que razão devemos acreditar no professor de Geografia ou de Ciências da Natureza? Porque o que ele diz está de acordo com o manual da disciplina. E por que devemos acreditar nesse manual? Porque foi escrito por especialistas. E como sabemos que são especialistas? Porque se não o fossem, não escreveriam manuais.

Estas três possibilidades em conjunto constituem o chamado trilema de Agripa, do nome do cético grego do século I a quem a tradição atribui a sua formulação. De acordo com este trilema, quando pretendemos justificar uma crença por intermédio de outras crenças estão disponíveis apenas três alternativas:

  1. Remontar infinitamente na cadeia de justificações;
  2. Raciocinar em círculo;
  3. Parar numa crença não suportada.

Nenhuma destas três possibilidades, afirmam os céticos, é melhor que a outra. Parar arbitrariamente na cadeia de justificações e raciocinar em círculo não é uma forma mais apropriada de justificar as nossas crenças do que regredir ao infinito. E como não existe outra alternativa, eles concluem que não é possível justificar nenhuma das nossas crenças e que, portanto, o conhecimento não existe."

Álvaro Nunes, texto retirado de https://criticanarede.com/anunesoproblemadoceticismo.html 

terça-feira, 7 de outubro de 2025

Texto para análise/resumo Madalena 11A

 


O que é o ceticismo?

0 argumento que acabamos de examinar - o de que não conhecemos nada sobre o mundo que nos cerca - chama-se argumento cético. Os céticos sustentam que, na verdade, não sabemos o que pensamos que sabemos. E a afirmação de que não sabemos nada sobre o mundo que nos cerca chama-se ceticismo sobre o mundo exterior.

Ceticismo "versus" senso comum

A visão do senso comum, é claro, sustenta que de facto conhecemos o mundo exterior. Na verdade, se resolvesse dizer, "não sei se as árvores existem", especialmente se estivesse a olhar para uma árvore em plena luz do dia, os outros achariam que tinha enlouquecido.

Mas os céticos achariam que estava certo. Não sabemos se árvores existem. 0 senso comum está enganado.

Outros exemplos de enganos do senso comum

Os argumentos dos céticos podem deixar algumas pessoas muito irritadas. Sabermos que as árvores existem é uma das nossas crenças mais básicas - como costumo dizer, sentimos que é isso é apenas senso comum. Existem muitas crenças que abandonaríamos com muita satisfação, caso alguém conseguisse demonstrar que estamos errados. Mas, quando se trata das crenças mais arraigadas do nosso senso comum - como a crença de que sabemos que as árvores existem -, não ficamos nada satisfeitos por abandoná-las.

Na verdade, ter as nossas crenças mais elementares ameaçadas pode ser uma experiência bem desconfortável, especialmente quando não vemos como defendê-las. Nessas ocasiões muitos ficam enraivecidos. Dizem que é um disparate o que o filósofo está a dizer. "Isso é uma completa estupidez", gritam. "Claro que eu sei que as árvores existem." E retiram-se, ofendidos.

Mas o filósofo pode apontar que em muitos outros casos se comprovou que o senso comum estava errado. Por exemplo, noutros tempos, o senso comum afirmava que a Terra era plana. As pessoas simplesmente achavam que era óbvio que a Terra fosse plana. Afinal, parece plana, não parece? Os marinheiros até tinham medo de chegar ao fim da Terra e cair. Também nessa época algumas pessoas ficavam muito irritadas quando a  sua crença comum era desafiada. "Não seja ridículo", gritavam. "É claro que a Terra é plana." E saíam a bater os pés. Hoje, porém, sabemos que a Terra não é plana. 0 senso comum estava enganado.

O que os céticos NÃO afirmam

Vale a pena deixar claro o que os céticos não afirmam, para não ficarmos confusos. Em primeiro lugar, os céticos não afirmam saber que nós ou eles somos cérebros numa cuba. Só afirmam que ninguém pode saber de maneira alguma se alguém é um cérebro numa cuba.

Em segundo lugar, eles não afirmam apenas que não podemos ter a certeza absoluta de que o mundo que vemos é real ou virtual. Afirmam muito mais do que isso. Afirmam que não temos razão alguma para acreditar que o mundo que vemos é real e não virtual.

Em terceiro lugar, eles não vão tão longe a ponto de afirmar que ninguém pode saber nada. Afinal, eles próprios reivindicam saber uma coisa: que ninguém pode conhecer o mundo exterior.

 Um enigma antigo

Estamos então diante de um enigma difícil. Por um lado, a visão do senso comum é que sabemos que as árvores existem. Nós não queremos de facto abrir mão dessa visão do senso comum (na verdade, nem estou certo de que poderíamos abrir mão dela mesmo que quiséssemos). Por outro, o cético tem um argumento que parece mostrar que a nossa visão do senso comum está errada: nós não sabemos que as árvores existem. Qual das visões está certa?

Apesar da roupagem moderna que eu lhe dei, este enigma é na verdade bem antigo. É de facto um dos enigmas filosóficos melhor conhecidos. Ainda hoje, nas universidades do mundo inteiro, os filósofos se debruçam sobre ele. E ainda não conseguiram decidir se os céticos têm razão. Eu devo admitir: não sei se os céticos têm ou não razão. Ao longo dos séculos, muitos filósofos tentaram lidar com o ceticismo. Procuraram demonstrar que o senso comum está certo: nós conhecemos efetivamente afinal o mundo que nos cerca. Algumas das suas tentativas para derrotar os céticos são muito perspicazes. Mas será que alguma delas funciona mesmo? Examinemos agora uma dessas tentativas.

 Stephen Law, Os Arquivos Filosóficos (São Paulo, 2003, págs. 60-69). 

segunda-feira, 6 de outubro de 2025

Snack Attack

Texto para resumo Lourenço 11A

 


Justificação

Podemos distinguir dois tipos de crenças: a mediata e a não mediata. Crenças mediatas são aquelas que adquirimos por intermédio de alguma estratégia que começa nas crenças que já possuímos. A inferência é uma estratégia (se bem que não a única); nós inferimos que vai chover a partir das crenças de que estamos a meio da manhã e que o céu está a escurecer. As crenças mediatas levantam a questão de saber se temos direito à estratégia que adotámos — se é uma estratégia que fazemos bem em usar. As crenças não mediatas são as que adotamos sem que, para as termos, seja necessário partirmos de outras crenças que já temos; e suscitam problemas diferentes, que dizem respeito à fonte do nosso direito em acreditar. Eu abro os olhos e, em razão do que vejo, acredito imediatamente que há um livro à minha frente. Se estou a agir bem ao adotar esta crença, ela justifica-se (ou tenho uma justificação para a adotar). Esta atenção dada à justificação é um modo de expressar a ideia de que a epistemologia é normativa. Então o que faz, neste caso, uma crença ser justificada?

Há várias respostas. Uma é a resposta fiabilista: a crença justifica-se porque é o resultado de um processo fiável. Outra é a resposta coerentista: a crença justifica-se porque o meu mundo é mais coerente com ela do que seria sem ela. Uma terceira é a alegação fundacionalista clássica, que entende que a crença não é de fato não-mediata, mas inferida de uma crença sobre como as coisas me aparecem neste preciso momento. Se esta última for verdadeira, somos lançados de novo em duas questões. A primeira consiste em saber se e como a crença sobre como as coisas me parecem neste preciso momento se justifica. A segunda questão reside em saber se a inferência extraída da primeira crença se justifica. Nós poderíamos perguntar, então, que princípio de inferência está a ser usado. Suponha-se que é este: se as coisas me aparecem de determinada maneira, são provavelmente dessa maneira. O que torna isto suficiente para nos levar a supor que agimos bem ao usar este princípio?


Jonathan Dancy,  Problemas da epistemologia

quinta-feira, 2 de outubro de 2025

Texto para resumo Juliana ou Laura 11A



Retire um livro retangular da sua estante e olhe para a capa. Qual é a cor predominante, e quantos lados tem? Ao responder a estas questões, o leitor fica a saber duas coisas acerca deste livro, e esses dois factos mostram uma importante distinção entre duas maneiras que temos de adquirir conhecimento.
Para ficarmos a saber a cor do livro temos que observá-lo (ou pedir a alguém que o faça por nós). A justificação para a sua crença acerca da sua cor é fornecida pela experiência (nossa ou de outrem). Mas não precisamos de olhar para um livro retangular para sabermos quantos lados tem. Sabemos que os retângulos têm quatro lados pelo simples facto de pensarmos o que é um retângulo. Adquirimos este conhecimento usando apenas os nossas poderes de raciocínio; não temos de considerar a informação dada pelos nossos sentidos. O conhecimento que é justificado pela experiência é denominado conhecimento "a posteriori" ou conhecimento empírico. O conhecimento em que a experiência não tem um papel justificatório é denominado conhecimento "a priori".



Dan O'Brien, Introdução à Teoria do Conhecimento

domingo, 28 de setembro de 2025

Texto para resumo Inês Nascimento 11A

Henry está a ver televisão numa tarde de Junho. Assiste à final masculina de Wimbledon e, na televisão, McEnroe vence Connors; o resultado é de dois a zero e «match point» para McEnroe no terceiro «set». McEnroe ganha o ponto. Henry crê justificadamente que
1 acabei de ver McEnroe ganhar a final de Wimbledon deste ano, e infere sensatamente que
2 McEnroe é o campeão de Wimbledon deste ano.
No entanto, as câmaras que estavam em Wimbledon deixaram na realidade de funcionar, e a televisão está a passar uma gravação da competição do ano passado. Mas enquanto isto acontece, McEnroe está prestes de repetir a retumbante vitória do ano passado. Portanto a crença 2 de Henry é verdadeira, ele tem decerto justificação para nela crer. Contudo, dificilmente aceitaríamos que Henry conhece 2.
Este tipo de exemplo contrário à descrição tripartida do conhecimento é conhecido como exemplo contrário de Gettier, segundo E. L. Gettier (1963). (Devo este exemplo específico a Brian Garrett.) Gettier argumentava que eles mostram que a descrição tripartida é insuficiente; é possível que alguém não conheça, mesmo que as três condições sejam realizadas.
Gettier não põe aqui em causa nenhuma das três condições. Aceita que elas são individualmente necessárias, e apenas argumenta que precisam de ser complementadas. (...)
O exemplo contrário de Gettier é por conseguinte um exemplo em que "a" tem uma crença justificada mas falsa por inferência a partir da qual ele justificavelmente crê que algo que acontece é verdadeiro, e chega deste modo a uma crença verdadeira justificada que não é conhecimento.
Que resposta poderá ser dada a estes infames mas ligeiramente irritantes exemplos contrários? Parece haver três vias possíveis:
1 encontrar algum meio de demonstrar que os exemplos contrários não funcionam;
2 aceitar os exemplos contrários e tentar encontrar um complemento à análise tripartida que os exclui;
3 aceitar os exemplos contrários e alterar a análise tripartida para os incluir em vez de lhe acrescentar o que quer que seja.
O restante prende-se com a primeira via.
Em que princípios de inferência se baseiam estes exemplos contrários? O próprio Gettier apresenta dois. Para que os exemplos funcionem, deve ser possível que uma crença falsa continue a ser justificada; e uma crença justificada deve justificar qualquer crença que ela implique (ou que se creia justificadamente que implique). Este último é precisamente o princípio da oclusão POj acima mencionado na discussão do cepticismo (1.2). Portanto, se pudéssemos mostrar que POj é falso, isto teria o duplo efeito de destruir os exemplos contrários de Gettier bem como (pelo menos em parte) o primeiro argumento céptico. Poderia ser, contudo, possível construir novas variantes do tema Gettier que não se baseiam na inferência ou numa inferência deste tipo, como veremos a seguir, e sendo assim não há queixas acerca do PO% ou de outros princípios que venham a ser muito eficientes.
Uma coisa que não podemos fazer é rejeitar os exemplos contrários de Gettier como forjados e artificiais. São perfeitamente eficientes nos seus próprios termos. Mas poderíamos sensatamente perguntar de que serve cansar o cérebro a descobrir uma definição aceitável de «a sabe que p». Será isto mais do que um mero exercício técnico? O que nos desconcertaria no facto de não conseguirmos elaborar uma definição à prova de problemas? Muitas das inúmeras dissertações escritas em resposta a Gettier dão a impressão de que responder a Gettier é uma espécie de jogo filosófico privado, que não tem qualquer interesse a não ser para os jogadores. E não nos demonstrou afinal Wittgenstein que um conceito pode ser perfeitamente legítimo sem ser definível, argumentando que não é indispensável que exista qualquer elemento comum a todos os casos de uma propriedade (p. ex. casos de conhecimento) para além do facto de serem casos (p. ex. de que são conhecimento)? (Cf. Wittgenstein, 1969b, pp. 17-18, e 1953, §§ 66-7.) Então o que é que poderia afinal depender do nosso êxito ou malogro para descobrir condições necessárias e suficientes para o conhecimento?

Ver mais aqui

Jonathan Dancy (1990), Epistemologia Contemporânea, Ed.70, Lx

 


quarta-feira, 24 de setembro de 2025

Texto para resumo Gui -11A

Diz-se frequentemente que o conhecimento aspira à verdade, no sentido em que quando acreditamos numa proposição, acreditamos que ela é o caso (i. e. que é verdadeira). Quando aquilo em que acreditamos é verdadeiro, dá-se uma coincidência entre o que pensamos ser o caso e o que é o caso. Acertamos na verdade. No entanto, se a mera crença verdadeira é suficiente para 'acertar' na verdade, podemos interrogar-nos porque é que os epistemólogos, na sua busca por uma boa definição de conhecimento, não se dão imediatamente por satisfeitos, aceitando que conhecimento não é mais do que crença verdadeira - i. e. acertar na verdade.
Há realmente uma boa razão que explica porque é que os epistemólogos não se contentam com a ideia de conhecimento como crença verdadeira. É que uma pessoa pode possuir uma crença verdadeira por acaso, situação em que não poderíamos atribuir-lhe mérito por acertar na verdade. Suponhamos que Henrique fica convencido de que o cavalo Moça Sortuda irá ganhar a próxima corrida só porque achou o nome do cavalo engraçado. Esta não é claramente uma boa base sobre a qual devêssemos construir uma crença acerca do vencedor da próxima corrida de cavalos, visto que o facto de acharmos o nome do cavalo apelativo não tem influência sobre a prestação deste durante a corrida.
Suponhamos, no entanto, que a crença de Henrique acaba por se tornar verdadeira, que Moça Sortuda ganha de facto a corrida. É isto conhecimento? Intuitivamente não, pois a crença é verdadeira apenas por uma questão de sorte. Não esqueçamos que o conhecimento é algo que se alcança, algo que resulta do mérito de alguém, não podendo ser aquilo que alcançamos puramente por uma questão de sorte.
Para enfatizar este ponto, pensemos por um momento no que significa alcançar um feito noutra área, como no tiro com arco. Se alguém é um bom arqueiro, ao tentar atingir o centro do alvo em condições favoráveis (por exemplo, sem um vento demasiado forte), atingi-lo-á habitualmente. É isso que significa ser um bom arqueiro. A palavra 'habitualmente' é aqui importante, porque àqueles que não são bons arqueiros acontece-lhes às vezes acertar no centro do alvo, mas não habitualmente. É possível que apontem a seta e que, por sorte, atinjam o centro do alvo. Mas significa isto que quem acerta numa ocasião é um bom arqueiro? Não, pela simples razão de que essas pessoas não seriam capazes de repetir a façanha. Se tentassem outra vez o mais certo era que a seta desaparecesse no céu.
Possuir conhecimento é algo semelhante. Imaginemos que uma crença é uma seta que apontamos ao alvo, neste caso a verdade. Atingir o alvo e formar uma crença verdadeira é acertar, visto que temos sucesso numa dada ocasião. No entanto, formar uma crença verdadeira não é suficiente para possuir conhecimento, tal como não basta acertar no centro do alvo por mera sorte para se ser um bom arqueiro. O conhecimento tem de ser um resultado dos nossos esforços, em vez de um resultado que se alcança por puro acaso. Isto quer dizer que o modo como formamos uma crença deve, em circunstâncias normais, conduzir habitualmente à verdade.
Henrique, que forma a crença verdadeira de que Moça Sortuda ganhará a corrida só porque gostava do nome do cavalo, é como a pessoa a quem aconteceu acertar no alvo e que não é um bom arqueiro. Formar uma crença sobre a possível vitória de um cavalo, considerando apenas se o seu nome tem ou não tem graça, conduzirá habitualmente à formação de uma crença falsa.
Comparemos Henrique com alguém que genuinamente sabe que a corrida será ganha por Moça Sortuda. Essa pessoa pode ser, por exemplo, um poderoso gangster que viciou a corrida, drogando os outros cavalos para que Moça Sortuda ganhasse. Ele sabe que a corrida será ganha por Moça Sortuda, pois o modo como ele formou a sua crença, baseando-se na informação privilegiada de que dispunha para pensar que Moça Sortuda não poderia perder, conduzi-lo-á normalmente a uma crença verdadeira. Não é por uma questão de sorte que o gangster atinge o alvo da verdade.
Deste modo, o desafio para os epistemólogos é explicar o que é necessário juntar à mera crença verdadeira de modo a que se obtenha conhecimento. Em particular, os epistemólogos precisam de explicar o que tem de ser acrescentado à crença verdadeira para capturar esta ideia de que o conhecimento, em contraste com a mera crença verdadeira, é um autêntico feito do agente, algo de que ele é responsável, no sentido de uma crença obtida não apenas por uma questão de sorte.
 

Duncan Pritchard, What is This Thing Called Knowledge? (Abington & New York: 2006, p. 6). Trad. Carlos Marques.

terça-feira, 23 de setembro de 2025

Texto para análise/resumo Cátia 11A

 


DEFINIÇÃO DO CONCEITO DE CONHECIMENTO - Teoria tradicional do conhecimento

1.Crença e Verdade

Devemos fazer notar duas ideias que fazem parte do conceito de conhecimento. Primeiro, se S sabe que p (que uma proposição é verdadeira), então tem de acreditar que p. Segundo, se S sabe que p, então p tem de ser verdadeira. O conhecimento requer tanto a crença quanto a verdade. Comecemos pela segunda ideia. As pessoas às vezes dizem que sabem coisas que mais tarde se revelam falsas. Mas isto não é saber coisas que são falsas, é pensar que se sabem coisas que, de facto, são falsas.

O conhecimento tem um lado subjectivo e um lado objectivo. Um facto é objectivo se a sua verdade não depende de como é a mente das pessoas. É um facto objectivo que a Serra da Estrela está 2 000 metros acima do nível do mar. Um facto é subjectivo se não é objectivo. O exemplo mais óbvio de um facto subjectivo é uma descrição do que acontece na mente de alguém.

Se uma pessoa acredita ou não que a Serra da Estrela está a 2 000 metros acima do nível do mar é uma questão subjectiva, mas se a montanha tem realmente essa propriedade é uma questão objectiva. O conhecimento requer tanto um elemento subjectivo como um elemento objectivo. Para que S conheça p, p tem de ser verdadeira e o sujeito, S, tem de acreditar que p é verdadeira.

2.Terceiro Requisito: Justificação

Apontei duas condições necessárias para o conhecimento: o conhecimento requer crença e requer verdade. Mas será que isto é suficiente? Será que estas duas condições não são apenas separadamente necessárias, mas também conjuntamente suficientes? é a crença verdadeira suficiente para o conhecimento?

Pensemos num indivíduo, Clyde, que acredita na história do Dia do Porco do Campo. Clyde pensa que se o Porco do Campo vir a sua própria sombra, a Primavera virá mais tarde. Suponha-se que Clyde põe este princípio idiota em prática este ano. Ele tem informações que o fazem pensar que a Primavera virá mais tarde. Suponha-se que Clyde acaba por ter razão acerca deste facto. Se não existir nenhuma conexão lógica entre o facto de o porco do campo ter visto a sua própria sombra e o facto de a Primavera vir mais tarde, então Clayde terá uma crença verdadeira (a Primavera virá tarde), mas não terá conhecimento.

Que será então necessário, para além da crença verdadeira, para que alguém possua conhecimento? A sugestão mais natural é a de que o conhecimento requer dados de apoio, ou uma justificação racional. Note-se que ter uma justificação não é apenas pensar que se tem uma razão para acreditar em algo.

Que significa dizer que um indivíduo tem uma crença “justificada” na proposição p? Uma justificação pode ter a forma de um argumento dedutivo, de um argumento indutivo ou de um argumento abdutivo. Talvez existam outras opções além destas três. Mas, o que quer que seja que entendemos por “justificação”, parece plausível dizer que as crenças que são defendidas irracionalmente não são casos de conhecimento (mesmo que elas sejam verdadeiras).

 O que é o conhecimento?

Elliott Sober

 

sábado, 20 de setembro de 2025

Texto para análise/resumo André11A




Antes de discutirmos se temos ou não conhecimento, temos de tornar claro o que é o conhecimento. Podemos falar de conhecimento em três sentidos diferentes, mas apenas um nos vai interessar.

Considerem-se as seguintes afirmações acerca de um sujeito, ao qual chamarei S:
1.                   S sabe andar de bicicleta.
2.                   conhece o Presidente dos EUA.
3.                   S sabe que a Serra da Estrela fica em Portugal.

Chamo conhecimento proposicional ao tipo de conhecimento apresentado em 3. Note-se que o objecto do verbo em 3 é uma proposição — uma coisa que é verdadeira ou falsa. Existe uma proposição — a Serra da Estrela fica em Portugal — e S sabe que essa proposição é verdadeira.
As frases 1 e 2 não têm esta estrutura. O objecto do verbo em 2 não é uma proposição, mas uma pessoa. O mesmo aconteceria se disséssemos que conhece Lisboa. Uma frase como 2 diz que S está ou esteve na presença de uma pessoa, de um lugar ou de uma coisa. Por isso dizemos que 2 corresponde a um caso de conhecimento por contacto.
Existe alguma ligação entre estes dois tipos de conhecimento? Possivelmente, para que conheça o Presidente dos Estados Unidos, terá de ter conhecimento proposicional acerca dele. Mas qual? Para que S conheça o Presidente terá de saber em que Estado ele nasceu? Isso não parece essencial. E o mesmo parece acontecer relativamente a todos os outros factos acerca dele: não parece haver qualquer proposição específica que seja necessário saber para se possa dizer que se conhece o Presidente. Conhecer uma pessoa implica, isso sim, ter um tipo qualquer de contacto directo com ela.
Chamemos ao tipo de conhecimento exemplificado em 1 conhecimento de aptidões. Que significa dizer que se sabe fazer alguma coisa? Penso que isto tem pouco a ver com o conhecimento proposicional. Uma pessoa pode saber andar de bicicleta aos cinco anos, e para isso não precisa de saber qualquer proposição acerca desse facto. O contrário também pode acontecer: uma pessoa pode ter muito conhecimento proposicional acerca de um assunto — de pintura, por exemplo — , e não ter qualquer conhecimento de aptidões a esse respeito.
Vamos aqui abordar apenas o conhecimento proposicional. Queremos saber o que é necessário para que um indivíduo S saiba que p, sendo p uma proposição qualquer — como a de que a Serra da Estrela fica em Portugal. Daqui em diante, quando falarmos de conhecimento, estaremos sempre a referir-nos ao conhecimento proposicional.
(…)

          Elliott Sober

Exercícios: 
Distinga os tipos de conhecimento expressos nas seguintes proposições:
1. Eu conheço o George Michael.
2. Sei andar de bicicleta.
3. Sei que a massa tem 10m de cozedura.
4. Sei que Montreal fica no Canadá.
5. Conheço a música de Amália Rodrigues.

quinta-feira, 29 de maio de 2025

Texto para resumo Matias 11C

 


Críticas: Terá Leibniz razão?

A primeira dificuldade da posição de Leibniz é que a sua resposta ao problema lógico do mal limita-se a explicar genericamente, mas não em particular, como os males são compatíveis com a divindade teísta. Considere-se um caso particular de sofrimento: uma criança de cinco anos, com uma doença grave e incurável, morre, depois de dois anos de sofrimento intenso. Não só sofreu ela, como sofreram os pais e familiares da criança, assim como os seus amigos; além disso, foram gastos recursos imensos que poderiam ter sido usados para fazer coisas criativas, como pintar quadros, praticar desportos ou escrever sonatas. Leibniz não nos diz em pormenor qual é o bem maior do qual todo este sofrimento é uma componente fundamental. Claro que podemos imaginar alguns desses bens: o estoicismo da própria criança, a abnegação dos pais e familiares, o profissionalismo e empatia profunda de médicos e enfermeiros. Contudo, é pura e simplesmente falso que, do nosso ponto de vista, estes bens superem o mal daquele sofrimento — basta pensar que nenhum progenitor que não seja perverso provocaria aquela doença no seu filho só porque daí resultam alguns bens. 

Esta dificuldade, porém, tem uma resposta óbvia da parte de Leibniz. Claro que não sabemos em pormenor quais são os bens maiores que fazem parte dos males que nos parecem gratuitos, diria ele; não o sabemos porque somos limitados. Porém, dado que se prova facilmente que a divindade teísta é logicamente incompatível com males gratuitos, levar a sério a existência dessa divindade obriga a levar a sério a ideia de que não há realmente males gratuitos. Esta ideia tem de ser levada a sério, por mais que isso nos pareça estranho e por mais que sejamos incapazes de explicar em pormenor que bens são esses que são constituídos por males aparentemente gratuitos. Tem de ser levada a sério porque não há outra maneira de tornar a divindade teísta compatível com o mal.

A primeira dificuldade recebe uma resposta óbvia, e perfeitamente razoável, mas acaba por levantar uma dificuldade muitíssimo mais importante e aparentemente fatal.

Muito humildemente, Leibniz considera que somos demasiado limitados para saber em pormenor quais são os bens que superam e tornam necessários os males evidentes. Porém, se somos limitados para saber isso, também somos limitados para saber se Deus existe ou não. É incoerente, ou pelo menos arbitrário, aceitar que não há a possibilidade de erro quando consideramos que sabemos que Deus existe, mas que somos demasiado limitados para saber quais são os bens que dão sentido aos males e os anulam. Ou somos demasiado limitados nos dois casos, ou em nenhum, porque é tão difícil saber se Deus existe, como difícil é saber quais são os bens que superam e anulam os males evidentes, caso Deus exista.

Em suma, a resposta de Leibniz ao problema do mal parece epistemicamente incoerente, ou pelo menos arbitrária.

Desidério Murcho in O estado da Arte

Resumo de texto Laura 11C

 


Leibniz (na Teodiceia)  encarregou-se  de defender um Criador acusado de crimes sem paralelo. A sua defesa reside em dois pontos. O primeiro é que o acusado não podia ter agido de outra forma. Como qualquer outro agente, estava limitado às possibilidades que tinha à Sua disposição. O outro ponto invoca o argumento de todas as ações do Criador acontecerem para o melhor, de facto. Uma parte da defesa é uma investigação às causas das ações do acusado, enquanto a outra tem a ver com a verdadeira natureza das suas consequências no mundo. É aqui que as teses de Leibniz parecem não só anteriores à experiência, mas nitidamente imunes a ela. Para esse efeito, deixa bem claro que qualquer facto, por horrível que seja, é compatível com a tese deste mundo  ser o melhor dos mundos possíveis. A afirmação de Leibniz não é uma teoria sobre a bondade deste mundo; diz-nos simplesmente que nenhum outro mundo teria sido melhor. Aqueles que tentaram contradizê-lo terão como resposta que não sabem o suficiente para o fazer, o que será certamente verdade. (…)

A defesa da justiça divina feita por Leibniz depende da divisão de toda a nossa aflição em mal metafísico, natural e moral. Será esta classificação, associada à hipótese de haver uma relação causal entre aqueles males, que nos parecerá violentamente necessitada de defesa. Para Leibniz, o mal metafísico é uma degeneração inerente ao limite da(s) substância(s) de que o mundo é feito. O mal natural é a dor e o sofrimento que sentimos nele. O mal moral é o crime pelo qual o mar natural é a punição inevitável. A suposição de o mal moral e natural terem uma relação de causa efeito nunca foi sujeita por Leibniz a uma pesquisa minuciosa. (…)

Há muito tempo, a vida era como devia ser. A terra era um jardim onde tudo era bom. A fome era saciada sem esforço; as crianças nasciam sem dor. Não conhecíamos morte, nem vergonha, nem ruína. Se tivéssemos de conceber um mundo, não o faríamos assim?

Se as coisas deviam ser desta maneira, alguma coisa deve explicar como elas são. A ideia de que o problema foi causado pelos pecados dos nossos antepassados não depende do que eles fizeram. Lamentarmos que provar o tipo errado de fruta tenha sido suficiente para uma sentença de morte pender sobre a cabeça de todos os descendentes, é falhar a questão filosófica essencial, e as tentativas cristãs de fazer aquela ação parecer pior do que foi, são vãs. Uma coisa trivial parece a explicação mais apropriada. O que conta, em primeiro lugar, não é a justiça da relação entre o que eles fizeram e o que sofreram, mas se deve haver alguma relação. Porque acontecem as coisas más? Porque se fizeram as coisas más? Mais vale ter alguma explicação causal do que permanecer no escuro. Relacionar o pecado com o sofrimento é separar os males do mundo em males morais e naturais, e criar desse modo um contexto para perceber as atribulações humanas.

Susan Neiman, O mal no pensamento moderno, Gradiva, Lx, 2005, p.37 e 38

domingo, 25 de maio de 2025

Texto para resumo Rafael 11C


Pascal, Pensamentos


Examinemos, pois, esse ponto, e digamos: Deus é, ou não é. Mas, para que lado penderemos? A razão nada pode determinar ai. Há um caos infinito que nos separa. Na extremidade dessa distância infinita, joga-se cara ou coroa. Que apostareis? Pela razão, não podeis fazer nem uma nem outra coisa; pela razão, não podeis defender nem uma nem outra coisa.
Não acuseis, pois, de falsidade os que fizeram uma escolha, pois nada sabeis disso. "Não: mas, eu os acusarei de terem feito, não essa escolha, mas uma escolha; porque, embora o que prefere coroa e o outro estejam igualmente em falta, ambos estão em falta: o justo é não apostar".
Sim, mas é preciso apostar: isso não é voluntário; sois obrigados a isso; (e apostar que Deus é, é apostar que ele não é). Que tomareis, pois? Vejamos, já que é preciso escolher, vejamos o que menos vos interessa: tendes duas coisas que perder, o verdadeiro e o bem, e duas coisas que empenhar, vossa razão e vossa vontade, vosso conhecimento e vossa beatitude; e vossa natureza tem duas coisas que evitar, o erro e a miséria. Vossa razão não é mais atingida, desde que é preciso necessariamente escolher, escolhendo um dentre os dois. Eis um ponto liquidado; mas, vossa beatitude?
Pesemos o ganho e a perda, preferindo coroa, que é Deus. Estimemos as duas hipóteses: se ganhardes, ganhareis tudo; se perderdes, nada perdereis. Apostai, pois, que ele é, sem hesitar. Isso é admirável: sim, é preciso apostar, mas, talvez eu aposte demais.
Vejamos. Uma vez que é tal a incerteza do ganho e da perda, se só tivésseis que apostar duas vidas por uma, ainda poderíeis apostar. Mas, se devessem ser ganhas três, seria preciso jogar (desde que tendes necessidade de jogar) e seríeis imprudente quando, forçado a jogar, não arriscásseis vossa vida para ganhar três num jogo em que é tamanha a incerteza da perda e do ganho. Há, porém, uma eternidade de vida e de felicidade; e, assim sendo, quando houvesse uma infinidade de probabilidades, das quais somente uma fosse por vós, ainda teríeis razão em apostar um para ter dois, e agiríeis mal, quando obrigado a jogar, se recusásseis jogar uma vida contra três num jogo em que, numa infinidade de probabilidades, há uma por vós, havendo uma infinidade de vida infinitamente feliz que ganhar. Mas, há aqui uma infinidade de vida infinitamente feliz que ganhar, uma probabilidade de ganho contra uma porção finita de probabilidades de perda, e o que jogais é finito. Jogo é jogo: sempre onde há o infinito e onde não há infinidade de probabilidades de perda contra a de ganho, não há que hesitar, é preciso dar tudo; e, assim, quando se é forçado a jogar, é preciso renunciar à razão, para conservar a vida e não arriscá-la pelo ganho infinito tão prestes a chegar quanto a perda do nada.

quinta-feira, 22 de maio de 2025

Matriz 4º teste 11º C – 30 maio 25

 


Mark Wallinger, School - Classroom, 1990


Este elemento de avaliação é composto por DOIS TESTES, cada um é avaliado de 0 a 20 valores. Cada teste avalia competências diferentes:

O 1º Teste avalia a competência do domínio dos conceitos -  Conceptualização - que vale 30% na avaliação final.

O 2º Teste destina-se a avaliar as competências de Problematização e Argumentação que valem 45% na avaliação final.

Estrutura e cotações:

1º Teste – Conceptualização - Total – 200 Pontos – Grupo I -10 questões de escolha múltipla (10x15 pontos=150 pontos); Grupo II - 2 questões de definição de conceito (2x25 pontos=50 pontos)

2º Teste – Problematização e Argumentação - Total -200 Pontos - Grupo I – Duas questões de argumentação (25 + 25); Grupo II - Três questões de problematização e argumentação (25 + 40 + 25); Grupo III - Uma questão de análise de texto e uma questão de construção argumentativa ( 30+ 30);

Conteúdos/Competências:


Filosofia da Arte e filosofia da religião


Filosofia da arte


  • Formular o problema da definição de arte, justificando a sua importância filosófica.

  • Enunciar as teorias essencialistas e não essencialistas.

  • Distinguir teorias essencialistas de teorias  não essencialistas.

  • Clarificar os conceitos, teses e argumentos das cinco teorias da arte: representacionista, expressivista, formalista, institucional e histórico-intencional.

  • Analisar criticamente as 5 teorias de definição de arte, apresentando e justificando as respetivas objeções e contra exemplos.



Filosofia da Religião


  • Formular o problema da existência de Deus, justificando a sua importância filosófica

  • Explicitar o conceito teísta de Deus.

  • Enunciar os argumentos ontológico (Anselmo), cosmológico e teleológico (Aquino) e teleológico (W.Palley)

  • Compreender os argumentos ontológico (Anselmo), cosmológico e teleológico (Aquino), e teleológico (W.Palley)

  • Analisar criticamente os argumentos ontológico, cosmológico e teleológico, enunciando e justificando as respetivas objeções.

  • Definir “Fideísmo”.

  • Apresentar “ A aposta de Pascal” como aposta fideísta.

  • Distinguir o fideísmo radical de Kierkegaard do fideísmo moderado de Pascal.

  • Colocar objeções ao fideísmo.