quinta-feira, 10 de março de 2016

Correção do teste do 11B - Março de 2016


 Grupo I

Versão A
1.B
2.D
3.A
4.D
5.A
6.C
7.D
8.A
9.C
10.D

VERSÃO B
1.D
2.A
3.B
4.D
5.C
6.D
7.A
8.C
9.D
10.A

Grupo II
 1.   Impressões e ideias são perceções mentais, isto é, constituem todo o conteúdo da mente que podemos conhecer. As primeiras são originais e antecedem as segundas que são cópias feitas mediante a memória das impressões vividas. Podemos ter ideias de objetos nunca antes vividos, se associarmos ideias simples, formando assim ideias complexas como a ideia de vampiro. Podemos também antecipar o prazer ou a dor vividas pela expectativa de as voltarmos a viver. Seja pela memória ou pela imaginação as perceções pensadas, ideias, não são nunca tão fortes e intensas como as vividas, impressões, e sendo que o original é sempre mais forte e perfeito que a cópia, Hume conclui que as impressões são atos originais e que não existem ideias sem na origem estar a impressão interna ou externa equivalente. As impressões podem ser simples ou complexas e podem ser interiores ou exteriores, sendo que as primeiras são vividas pela sensibilidade e as segundas resultam de um sentimento, paixão ou dor vividos interiormente pelo sujeito. As ideias podem ser ainda gerais quando resultam da associação de ideias simples, de acordo com a sua semelhança para a formação dos conceitos, ou as ideias complexas são o fruto da associação de ideias simples através da imaginação.


2. Conhecimento de questões de facto e conhecimento de relação de ideias. O primeiro dá-nos a informação sobre o modo como o mundo é, mas o o conhecimento que daí resulta é contingente e não necessário. As verdades de facto como: "A ponte 25 de Abril situa-se em Lisboa" podem ser negadas sem que esta negação implique contradição,  pois poderia ser de outro modo, não repugna racionalmente que a Ponte não estivesse em Lisboa, essa proposição faz sentido e poderia ainda ser pensada. Assim, todos os conhecimentos de facto que são justificados pela experiência, não são verdades necessárias, ora todas as verdades contingentes são apenas provavelmente verdadeiras. O segundo conhecimento não nos acrescenta nova informação àquela que já está contida nos conceitos ou ideias, por exemplo; " O quadrado tem quatro lados", porque se é um quadrado tem de ter quatro lados, isto é, o predicado faz parte da definição do conceito. Por outro lado este conhecimento é necessário, é sempre verdadeiro e o seu contrário implica uma contradição, é impossível pensar o seu contrário, isto é não tem sentido um quadrado ter mais ou menos que quatro lados.Explicação: Conhecimento de factos é contingente e a sua negação não implica contradição, enquanto que o conhecimento de relação de ideias é necessário e a sua negação implica uma contradição. Explicação: relacionar ideias só necessita de um acordo lógico da razão consigo mesma, é independente dos factos do mundo, logo pode ser um conhecimento necessário visto que está fundado em leis universais e necessárias que são as leis racionais. Quanto ao conhecimento dos factos, necessita da experiência, das impressões e percepções, essa experiência é limitada, visto que o sujeito não pode conhecer todos os factos. A experiência mostra-nos uma realidade em mudança, e a necessidade de alterar crenças, logo ,o conhecimento resultante da experiência, é também contingente, pois poderia ser de outro modo, não podemos ter acesso a verdades necessárias, não é necessário que aconteça assim, há a sempre a possibilidade de mudança, de ser de outro modo.




3. A tese empirista de D. Hume sobre a conexão causal é a seguinte:
                         a) Não há nenhuma impressão de conexão causal; ora se não há impressão também não pode haver ideia, visto qeu, segundo o empirismo não há ideias sem impressões sensíveis.
                         b)   A impressão que temos é da repetição de fenómenos em sucessão no tempo e contiguidade no espaço: “O mesmo objecto é seguido pelo mesmo evento”. Esta repetição de um fenómeno a seguir ao outro leva-nos a estabelecer a crença de que estes andam sempre ligados, isto é, se sucede um, logo a seguir tem de suceder outro.
c)                       Esta crença a que chamamos relação de causa efeito ou conexão causal não está justificada nem empiricamente nem racionalmente, porque “ não há nada que produza qualquer impressão, e consequentemente nada que possa sugerir qualquer ideia de poder ou conexão necessária”, o que temos a impressão é de fenómenos singulares, isolados embora sucedendo-se uns aos outros;  logo não há conhecimento mas um hábito psicológico que é criado pela sucessiva repetição dos fenómenos que se apresentam ligados. Se o conhecimento de causa efeito tem a sua origem na experiência e de modo nenhum é “apriori” (argumento do ser racional que nada soubesse do mundo, jamais poderia ter a noção de causa efeito) então é um conhecimento de facto e é contingente, todavia julgamos e pensamos como uma conexão necessária e, portanto, ultrapassamos a experiência.
d)                             Logo, para concluir não há uma explicação empírica para uma conexão necessária, ela é apenas fruto do costume, um hábito psicológico.




 4. Descartes é um filósofo racionalista. O Racionalismo cartesiano como perspectiva filosófica, fundamenta o conhecimento na razão e na capacidade desta retirar ideias a partir de outras ideias de forma evidente e dedutiva sem recorrer à experiência - ideias inatas. O Modelo de conhecimento verdadeiro para os racionalistas é o modelo matemático porque tem necessidade lógica e validade universal. Descartes é um filósofo racionalista porque defende a possibilidade de um conhecimento “a priori”. O critério da verdade do conhecimento é a evidência das ideias, uma vez que uma ideia é tão clara e distinta que se apresenta inquestionável à razão, essa ideia é verdadeira. Segundo o modelo matemático estas ideias são como axiomas que servem como fundamentos para outros conhecimentos deduzidos a partir delas.O Racionalismo defende que o conhecimento verdadeiro é a priori, isto é , independente da experiência. Poderíamos rejeitar todas as informações que derivam das sensações do mundo, o tacto, o cheiro, a visão dos objectos, restariam as ideias que são formadas pela razão e por ela intuídas e, que não tendo origem na experiência porque não derivam dela, são válidas por si, e tão claras e evidentes à Razão que esta vê, segundo a sua luz natural, que não poderiam ser de outro modo. Os Racionalistas crêem que estas ideias podem ser os princípios (crenças básicas) de todo o conhecimento e que a partir delas, por um raciocínio dedutivo se pode chegar a outros conhecimentos sobre a realidade , que, se dedução for feita correctamente, serão igualmente verdadeiros.
Quanto ao Empirismo rejeita as ideias inatas da Razão, e a noção de conhecimento "a priori" . Defende a tese de que nada existe na mente que não tenha passado antes pelos sentidos, fundamenta-se na noção de que qualquer conceito para ter um significado tem que se referir a uma sensação/impressão qualquer, essas sensações são simples e a mente neste primeiro momento capta apenas as sensações e depois por abstração e generalização forma os conceitos ou ideias, estas não são tão vivas como as sensações ou impressões o que quer dizer que são posteriores a estas. Os empiristas dão o exemplo das crianças que começam por ter sensações e só depois as articulam numa linguagem. O raciocínio que o entendimento faz para chegar ao conhecimento, segundo os empiristas é a indução, por acumulação de experiências que se repetem, generaliza-se para todos os casos e assim se obtém um conhecimento 



Grupo III

1. 1ª Figura Modo AII

2. Falácia da ilícita menor, o termo menor (conjuntos de proposições) ocorre na conclusão distribuído mas não está distribuído na premissa onde ocorre, infringe a regra dos silogismos que proíbe que um termo possa estar distribuído na conclusão e não estar na premissa onde ocorre.

terça-feira, 1 de março de 2016

Matriz da 4ª prova de avaliação 11ºAno Março de 2016


Estrutura: Grupo I- 4x30 Pontos.Perguntas de construção e desenvolvimento
Grupo II: Escolha múltipla: 10x5 Pontos =50 Pontos. 
Grupo III: 2x15 Pontos. Perguntas de resposta breve.

Conteúdos
1. O que é o conhecimento?
a. Quais os tipos de conhecimento. b. Em que consiste a fenomenologia do conhecimento. c. Como se justifica a teoria da Crença Verdadeira e Justificada. d. Em que consiste a teoria da Crença Verdadeira e Justificada. e. Objecções a esta teoria. Os contra-exemplos de Gettier II

2. Duas teoria interpretativas do conhecimento:
2. a. A Teoria racionalista de Descartes. - A dúvida metódica. - As etapas da dúvida - A ideia do cogito como crença auto-justificada - As ideias de Deus corpo e alma - As provas da existência de Deus. - Objecções às provas da existência de Deus: A petição de princípio - A origem do conhecimento: O racionalismo fundacionista de Descartes. Substâncias e ideias. As substâncias divina, pensante e extensa e as ideias inatas, adventícias e fictícias. O conhecimento "apriori" e "a posteriori".Os raciocínios: Intuição e Dedução.Os argumentos cépticos.

2.b. O empirismo de David Hume. - O cepticismo moderado de Hume. - A origem do conhecimento: a experiência. - Impressões e ideias - Conhecimento de questões de facto e relação de ideias. - Verdades necessárias e contingentes. - O pensamento vai além da experiência. - A ideia de causa e efeito não está justificada - O problema da indução - O problema do mundo exterior.

3. Lógica formal: Silogismos - Figuras, Modos e Validade.


Competências:
1. Saber reconhecer as teses e os argumentos de um texto. 2. Compreender as várias teorias. 3. Expor de forma clara e objectiva um pensamento. 4. Definir com rigor os conceitos filosóficos. 5. Usar de forma correcta os conceitos. 6. Justificar com razões fortes as afirmações proferidas. 7. Escrever correctamente.

BOM ESTUDO E DELICIOSAS IDEIAS!!

domingo, 28 de fevereiro de 2016

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Para testar conceitos e teses.

Clique para aceder ao diapositivo:

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

O empirismo de David Hume.



Hume começa, tal como Locke, por considerar os conteúdos da mente, os objectos do entendimento humano ou – nas suas palavras – as percepções da mente ou materiais do pensamento. Hume divide estes conteúdos em impressões e ideias. Há uma clara distinção, já notada por Locke, entre sentir realmente dor, calor, raiva, ver uma paisagem, ouvir uma sirene ou desejar uma bebida fresca e recordar mais tarde ou imaginar estas experiências. Hume usa o termo «impressões» para indicar «as nossas percepções mais vívidas, quando ouvimos, ou vemos, ou sentimos, ou amamos, ou odiamos».
As ideias têm menos força, são cópias fracas das impressões, trazidas à mente pela memória ou pela imaginação.

 Qual, para Hume, é a relação entre ideias e impressões? Hume afirma que «todas as nossas ideias ou percepções mais débeis são cópias das nossas impressões ou percepções mais “vívidas”». Por outras palavras, as ideias derivam apenas da experiência. É claro que Hume sabe que algumas ideias – por exemplo, a minha ideia de unicórnio – não correspondem exactamente a uma impressão particular. Mas as partes que compõem a minha ideia de um unicórnio – ideias de cavalos e de chifres – são cópias de coisas que já vi no mundo. Limitei-me a combinar ideias derivadas da experiência de uma maneira nova. A ideia de Hume é que apesar de a mente parecer porventura quase ilimitada na sua capacidade de imaginar e pensar abstractamente, a matéria bruta sobre a qual ela opera é sempre extraída de impressões.

 É este o cerne do empirismo, e Hume oferece alguns argumentos em sua defesa. Sugere que pensemos nas nossas próprias ideias e que tentemos apontar uma que não dependa de uma impressão original. Ataca também directamente a ideia favorita dos racionalistas – a ideia de Deus –, e mostra que podemos adquiri-la pensando nas qualidades das nossas mentes exagerando depois tanto quanto quisermos o que há nelas de bom e de sábio. Finalmente, considera os indivíduos que têm falta de uma aptidão sensorial – os cegos, por exemplo – e nota que estes não têm nenhuma ideia de cor. A explicação, argumenta, é que as ideias são cópias das impressões, e que quem nunca teve impressões relevantes não pode ter as ideias correspondentes.

 Há certos factos sobre impressões e ideias que nas mãos de Hume têm consequências filosóficas de longo alcance. Comparadas com as impressões, as ideias são naturalmente fracas e obscuras e é fácil cometer dois tipos de erros quando pensamos sobre elas. Em primeiro lugar, podemos confundir uma ideia com outra, podemos pensar que se justifica tirar uma certa conclusão acerca de uma ideia quando o que realmente acontece é que estamos a pensar numa ideia semelhante, mas diferente. Em segundo lugar, e pior, usamos palavras para representar ideias, e o nosso discurso pode desenrolar-se alegremente mesmo que as partes relevantes da nossa linguagem não tenham correspondência com alguma ideia fixa ou determinada. Numa disputa filosófica, quando não estamos a falar em cavalos e de chifres, mas em ideias muito complexas e abstractas, é fácil termos uma conversa em que são usadas as mesmas palavras para mencionar coisas diferentes. Podemos até discutir sobre nada. A nossa disputa poderá ser sobre ideias ilusórias, meros fantasmas sem base na experiência – o equivalente filosófico dos unicórnios.

 Estas reflexões fornecem um procedimento que nos permite remover as ideias fictícias e encontrar saídas para as disputas filosóficas, e mesmo para acabar com elas. Hume escreve:

Quando por conseguinte temos alguma suspeita de que um termo filosófico é empregue sem nenhum significado ou ideia (como é muito frequente), basta-nos perguntar sobre a impressão de que a ideia supostamente deriva. E se for impossível encontrar alguma, isto servirá para confirmar a nossa suspeita. Ao clarificar assim as ideias, podemos razoavelmente esperar que possam ser removidos todos os conflitos que possam surgir sobre a sua natureza e realidade.

As consequências destas linhas são estonteantes.

 Consideremos a ideia de um eu durável, algo de substancial que persiste por detrás das muitas mudanças que experimentamos ao vivermos a vida. Suponho, por exemplo, que esta manhã sou essencialmente o mesmo eu que era quando me fui deitar a noite passada. Não só isso, acho também que sou o mesmo eu que era na juventude que desaproveitei. Acho que serei o mesmo eu enquanto viver. Sem dúvida, algumas coisas mudaram: cresci, ganhei algumas cicatrizes, o meu cabelo está a tornar-se um pouco grisalho. Contudo, parece haver algo de essencial, o meu verdadeiro eu, que persiste em todas estas alterações acidentais.

 Se concordarmos com o princípio de Hume sobre a relação entre ideias e impressões, e se estivermos convencidos de que o seu método de remover ideias fictícias é o caminho certo, temos apenas que perguntar: «De que impressão é a minha ideia derivada?» Ao olhar para dentro de mim, afirma Hume, não encontro nada, excepto uma série de impressões fugazes – ódio, amor, calor, dor, imagens, sons, cheiros e coisas do género –, mas nada permanente, nada que persista em todas as alterações. Em suma, nenhuma impressão corresponde à nossa ideia de eu. A ideia presente na palavra «eu» pode juntar-se a «unicórnio»: «eu» é uma palavra que expressa uma ideia ilusória, uma ficção da imaginação.

 Mas as coisas tornam-se muito piores. A abordagem que Hume faz da natureza do entendimento humano começa com uma distinção entre dois tipos de «objectos da razão humana»: relações de ideias e matérias de facto. As relações de ideias podem ser descobertas apenas pela razão. Podemos saber que os solteiros são homens não casados ou que duas vezes cinco é metade de vinte pensando apenas sobre as relações entre as ideias em causa. As matérias de facto, porém, podem apenas ser descobertas pela experiência. Podemos meditar o tempo que quisermos sobre a proposição de que o sol está a brilhar, mas só saberemos se ela é verdadeira olhando pela janela. Há outra diferença entre estes dois tipos de proposição. O contrário de uma matéria de facto é possível, mas se negarmos uma relação entre ideias verdadeira, incorremos numa contradição. O sol pode não ser brilhante, mas não se pode estar mais longe da verdade do que quando alegamos que os solteiros são casados.

James Garvey, The Twenty Greatest Philosophy Books (London, 2006, págs. 66-68). Trad. Maria Miguel Pires (rev. científica Logosferas).

Correcção dos testes de Filosofia.FEV.2016


Versão A
Grupo 1
1. A dúvida metódica  consiste em examinar sistematicamente os fundamentos de todas as crenças e considerar falso, tudo o que fosse apenas duvidoso. Assim, as etapas da dúvida metódica são: 1ª Duvidar dos sentidos; 2ª Duvidar da existência do mundo; 3º Duvidar das verdades da razão.
Argumento 1: Uma vez que os sentidos nos enganam algumas vezes, podemos duvidar do que vemos ou sentimos, logo, não podem ser os fundamentos inabaláveis do conhecimento.

Argumento 2 : A realidade que vemos depende do estado de vigília que julgamos ter, mas não poderemos pensar que se trata de um sonho? No sonho estamos perante factos e, no entanto eles não são reais, o mesmo pode acontecer com toda a realidade exterior, que poderemos estar a sonhar e, por isso não ser real.

Argumento 3: As verdades matemáticas são inabaláveis mas poderíamos supor a existência de um génio maligno que nos enganasse sempre que pensamos numa verdade matemática levando-nos a dar o consentimento a algo que é falso. Assim a certeza das verdades matemáticas também é colocada em questão.

2.A ideia do cogito “ Penso, logo existo” surge com clareza e distinção de modo a ser de tal modo evidente que o pensamento só a poderia considerar verdadeira, pois não poderia ser de outro modo. Descartes compreende com o Cogito que a verdade é um acordo da razão consigo própria, e só a razão é juiz do conhecimento e pode distinguir o verdadeiro do falso. Compreende ainda através do cogito que o conhecimento humano é possível pois a verdade encontra-se claramente demonstrada e a partir dessas verdades primárias (metafísicas), ou crenças básicas poder-se-ia conhecer outras verdades sobre as ciências por simples raciocínio dedutivo.

3. Platão contraria Górgias quanto à Retórica ser uma arte. Na verdade a Retórica, argumenta Platão não é uma arte porque nada sabe sobre os assuntos sobre os quais discorre, funciona ao invés copiando as verdadeiras artes ou ciências, persuadindo por adulação e não apelando ao conhecimento. assim as verdadeiras artes do corpo são a medicina e a ginástica pois contribuem para melhorar o corpo, afastando as doenças ou tornando-o mais forte. A Retórica está para as artes do corpo como a toilette está para a ginástica e a cozinha para a medicina. Não são artes mas actividades empíricas, aprendem-se praticando mas não há um saber teórico que lhes permita explicar a razão dos seus procedimentos. As falsas artes parecem-se com as verdadeiras e são persuasivas porque destinam-se a agradar, e por produzirem agrado são facilmente adoptadas por multidões de ignorantes que nada sabem sobre as verdadeiras artes.


Versão B
Grupo 1
1. A dúvida metódica foi a forma encontrada por Descartes para superar as dúvidas e as incertezas dos céticos que punham em causa a possibilidade de um conhecimento verdadeiro. Com a dúvida metódica, Descartes conseguiu demonstrar que há verdades indubitáveis e que se auto-justificam,  isto é, não necessitam  de outras crenças para se justificarem . Contraria assim o argumento da regressão infinita utilizado pelos céticos para criticar o conhecimento, alegando que nenhuma crença está justificada porque necessita sempre de outra que a justifique.

A dúvida metódica  consiste em examinar sistematicamente os fundamentos de todas as crenças e considerar falso, tudo o que fosse apenas duvidoso. Assim, as etapas da dúvida metódica são: 1ª Duvidar dos sentidos; 2ª Duvidar da existência do mundo; 3º Duvidar das verdades da razão.
Argumento 1: Uma vez que os sentidos nos enganam algumas vezes, podemos duvidar do que vemos ou sentimos, logo, não podem ser os fundamentos inabaláveis do conhecimento.

Argumento 2 : A realidade que vemos depende do estado de vigília que julgamos ter, mas não poderemos pensar que se trata de um sonho? No sonho estamos perante factos e, no entanto eles não são reais, o mesmo pode acontecer com toda a realidade exterior, que poderemos estar a sonhar e, por isso não ser real.

Argumento 3: As verdades matemáticas são inabaláveis mas poderíamos supor a existência de um génio maligno que nos enganasse sempre que pensamos numa verdade matemática levando-nos a dar o consentimento a algo que é falso. Assim a certeza das verdades matemáticas também é colocada em questão.

2..Depois de concluir que de todas as verdades que julgara possuir só uma, a de que existia, parecia ser certa e inabalável, Descartes, fica sozinho com esta única certeza, não podendo provar que as coisas em redor dele existiam e sem poder confiar  em qualquer conhecimento obtido pela experiência. Visto considerar-se imperfeito, pois via claramente que duvidar e errar eram imperfeições e que há mais perfeição em quem não erra do que em quem erra (conhecer é perfeição maior que duvidar), interroga-se então qual a origem desta sua  ideia de perfeição? Não podia ser ele próprio, nem podia surgir do nada, visto que
 (não há menos repugnância em que o mais perfeito seja uma consequência e uma dependência do menos perfeito do que em admitir que do nada procede alguma coisa).

 Também não podia surgir da natureza porque nada na natureza lhe parecia superior a ele. Mas esta ideia não poderia ser retirada de algo que possuísse algumas imperfeições, só podia ter como causa um ser sumamente perfeito. (restava apenas que tivesse sido posta em mim por uma natureza que fosse verdadeiramente mais perfeita que a minha). A causa da minha ideia de perfeito só pode ser um ser com todas as perfeições, esse ser só pode ser Deus. Logo, Deus existe.

3. Um bom orador é capaz de persuadir qualquer pessoa sobre qualquer assunto, mesmo que nada saiba sobre ele, (não tem necessidade de conhecer o que é justo) apenas tem que parecer que conhece face à multidão (que aparente sê-lo à multidão que deve julgar). Deste modo a Retórica é uma falsa Arte porque manipula e ilude parecendo aquilo que não é. Concentra-se na forma de tornar o discurso agradável e não com o seu conteúdo de verdade.
Para Platão a questão principal do discurso e do conhecimento não é a persuasão, um orador não deve ter o propósito de persuadir, isto é, de conseguir a concordância de todos, o seu único propósito deve ser a verdade. Ora para os sofistas,  a verdade não existe ou se existe nada se pode saber sobre ela, logo,  o homem é a medida de todas as coisas, só ele pode decidir em cada situação o que é verdade, mas essa verdade varia de homem para homem de acordo com os seus interesses e perspetivas. Para os sofistas só podemos ter opiniões e todas as opiniões valem o mesmo, a sua aceitação por parte do auditório depende apenas do modo como a defendemos, daí que a arte de argumentar e a eloquência sejam importantes e decisivas. A educação dos jovens deve ter como principal disciplina a Retórica porque com ela se alcança o sucesso.
Para Platão, a verdade não pode ser uma mera opinião aprendida com outros, implica um conhecimento, uma investigação racional que afasta todas as opiniões.  A opinião é uma aparência de verdade, mesmo quando verdadeira a opinião ainda não é conhecimento. Para ser conhecimento tem de estar justificada com razões, não razões que a tornem mais agradável e verosímil, mas razões que a demonstrem, isto é que mostrem que é assim e não pode ser de outro modo


domingo, 21 de fevereiro de 2016

sábado, 20 de fevereiro de 2016

Descartes

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Ficha de avaliação e revisão de conhecimentos com Correcção


GRUPO I
(3x30 Pontos)
Texto 1

“Depois, examinando com atenção o que eu era, e vendo que podia supor que não tinha corpo algum e que não havia qualquer mundo, ou qualquer lugar onde eu existisse, mas que nem por isso podia supor que não existia; e que, ao contrário, pelo fato mesmo de eu pensar em duvidar da verdade das outras coisas,  seguia-se mui evidente e mui certamente que eu existia; ao passo que, se apenas houvesse cessado de pensar, embora tudo o mais que alguma vez imaginara fosse verdadeiro, já não teria razão alguma de crer que eu tivesse existido; compreendi por aí que eu era uma substância cuja essência ou natureza consiste apenas no pensar, e que, para ser, não necessita de nenhum lugar, nem depende de qualquer coisa material. De sorte que esse eu, isto é, a alma pela qual sou o que sou, é inteiramente distinta do corpo e, mesmo, que é mais fácil de conhecer do que ele, e, ainda que este nada fosse, ela não deixaria de ser tudo o que é.”
Descartes, Discurso do Método, 4ºCapítulo

1. Explique o problema colocado por Descartes.

1. O sentido deste texto centra-se na descoberta, por parte de Descartes, de uma certeza absoluta do seu pensamento e a confiança de que a razão pode, só por si, alcançar o conhecimento verdadeiro. Essa certeza resulta da dúvida sistemática sobre todas as suas crenças, e resume-se na ideia de que se duvido é necessário que pense, há algo que dúvida, esse algo existe. A ideia do cogito “ Penso, logo existo” surge com clareza e distinção de modo a ser de tal modo evidente que o pensamento só a poderia considerar verdadeira, pois não poderia ser de outro modo. Descartes compreende com o Cogito que a verdade é um acordo da razão consigo própria, e só a razão é juiz do conhecimento e pode distinguir o verdadeiro do falso. Compreende ainda através do cogito que o conhecimento humano é possível pois a verdade encontra-se claramente demonstrada e a partir dessas verdades primárias (metafísicas), ou crenças básicas poder-se-ia conhecer outras verdades sobre as ciências por simples raciocínio dedutivo
2. Diga quais as etapas da dúvida metódica cartesiana.
2. A dúvida metódica foi a forma encontrada por Descartes para superar as dúvidas e as incertezas dos céticos que punham em causa a possibilidade de um conhecimento verdadeiro. Com a dúvida metódica, Descartes conseguiu demonstrar que há verdades indubitáveis e que se auto-justificam,  isto é, não necessitam  de outras crenças para se justificarem . Contraria assim o argumento da regressão infinita utilizado pelos céticos para criticar o conhecimento, alegando que nenhuma crença está justificada porque necessita sempre de outra que a justifique.
A dúvida metódica  consiste em examinar sistematicamente os fundamentos de todas as crenças e considerar falso, tudo o que fosse apenas duvidoso. Assim, as etapas da dúvida metódica são: 1ª Duvidar dos sentidos; 2ª Duvidar da existência do mundo; 3º Duvidar das verdades da razão.
Argumento 1: Uma vez que os sentidos nos enganam algumas vezes, podemos duvidar do que vemos ou sentimos, logo, não podem ser os fundamentos inabaláveis do conhecimento.
Argumento 2 : A realidade que vemos depende do estado de vigília que julgamos ter, mas não poderemos pensar que se trata de um sonho? No sonho estamos perante factos e, no entanto eles não são reais, o mesmo pode acontecer com toda a realidade exterior, que poderemos estar a sonhar e, por isso não ser real.

Argumento 3: As verdades matemáticas são inabaláveis mas poderíamos supor a existência de um génio maligno que nos enganasse sempre que pensamos numa verdade matemática levando-nos a dar o consentimento a algo que é falso. Assim a certeza das verdades matemáticas também é colocada em questão.


3. Demonstre a prova da existência de Deus.

3.Depois de concluir que de todas as verdades que julgara possuir só uma, a de que existia, parecia ser certa e inabalável, Descartes, fica sozinho com esta única certeza, não podendo provar que as coisas em redor dele existiam e sem poder confiar  em qualquer conhecimento obtido pela experiência. Visto considerar-se imperfeito, pois via claramente que duvidar e errar eram imperfeições e que há mais perfeição em quem não erra do que em quem erra (conhecer é perfeição maior que duvidar), interroga-se então qual a origem desta sua  ideia de perfeição? Não podia ser ele próprio, nem podia surgir do nada, visto que
 (não há menos repugnância em que o mais perfeito seja uma consequência e uma dependência do menos perfeito do que em admitir que do nada procede alguma coisa).

 Também não podia surgir da natureza porque nada na natureza lhe parecia superior a ele. Mas esta ideia não poderia ser retirada de algo que possuísse algumas imperfeições, só podia ter como causa um ser sumamente perfeito. (restava apenas que tivesse sido posta em mim por uma natureza que fosse verdadeiramente mais perfeita que a minha). A causa da minha ideia de perfeito só pode ser um ser com todas as perfeições, esse ser só pode ser Deus. Logo, Deus existe.


Grupo II
(4x15 Pontos)

1. Segundo a definição tradicional de conhecimento este consiste numa crença verdadeira e justificada. Porquê?
1. Tem de ser uma crença porque seria contraditório saber alguma coisa e não acreditar nisso, tem pois de o conhecimento ser uma crença. Tem de ser verdadeira porque o conhecimento é factivo não pode haver conhecimento de falsidades. Não basta ser uma crença verdadeira tem que estar justificada por boas razões porque o conhecimento não surge por acaso.

2.“O relógio da igreja da tua terra é bastante fiável e costumas confiar nele para saber as horas. Esta manhã, quando vinhas para a escola, olhaste para o relógio e viste que ele marcava exactamente 8h e 20m. Por isso, formaste a crença de que eram 8h e 20m. O facto do relógio ter sido fiável no passado justifica a tua crença. Contudo, sem que o soubesses, o relógio tinha avariado no dia anterior exactamente quando marcava 8h e 20m.

O que prova este exemplo?

Prova que podemos ter uma crença verdadeira, que está justificada pela experiência anterior e não corresponde a um conhecimento. Prova portanto que a definição tradicional de conhecimento está incompleta.

3. Diga quais os tipos de conhecimento e exemplifique.
Proposicional: "Sei que Paris é a capital da França" é o conhecimento que se elabora em proposições com valor de verdade, pode ser transmitido. 
Por contacto " Conheço Paris" implica contacto directo com o objecto do meu conhecimento.
Saber fazer: " Sei tocar piano" conhecimento que se adquire pela prática e pela experiência e não por proposições.

4. Descreva o acto cognitivo como relação sujeito-objecto.
O acto cognitivo pode descrever-se como um fenómeno que coloca frente a frente um sujeito e um objecto. O objecto é o que é conhecido e o sujeito aquele que conhece. Este fenómeno dá-se em 3 momentos: O sujeito sai de si, permanece na esfera do objecto e volta a si com uma representação (imagem) do objecto. O Objecto é transcendente ao sujeito porque não se deixa possuir na representação que o sujeito tem, permanece como algo exterior ao sujeito do qual ele apenas tem uma imagem na sua consciência mas não o objecto em si que não pode ser reduzido a uma imagem, é algo para além dela.

Grupo IV
( 2x25 Pontos)


1. SALVIATI – […] Espanta-me […] que não vos apercebais que Aristóteles supõe o que precisamente está em questão. Ora notai… SIMPLÍCIO – Suplico-vos, Senhor Salviati, falai com mais respeito de Aristóteles. A quem convenceríeis, aliás, de que aquele que foi o primeiro, o único, o admirável explicador da forma silogística, da demonstração, das refutações, […] de toda a lógica, em suma, tenha podido cair num erro tão grave como o de supor conhecido o que está em questão?

Galileu Galilei, Diálogo dos Grandes Sistemas (Primeira Jornada), Lisboa,

1.1. Nomeie a falácia cometida por Aristóteles, segundo Salviati.

Argumento falacioso é aquele que parece ser válido mas não é válido ou porque tem premissas falsas ou porque as premissas não são suficientes ou relevantes para retirar uma conclusão. Por ter uma falsa aparência este argumento é enganador. Pode ser eficaz pela força psicológica mas não tem validade lógica.A falácia cometida é uma Petição de princípio. Porque Aristóteles supõe como conhecido o que está em questão. 


1.2. Distinga manipulação e persuasão. Exemplifique.

O Bom uso da retórica implica a subordinação a princípios éticos: 
Princípio ético, por excelência, o reconhecimento da autonomia, da capacidade de escolha do auditório.
Esclarecimento da situação, das várias alternativas e dos seus pressupostos e consequências. Exige liberdade de expressão do pensamento.
O Mau uso da retórica – a argumentação degenera numa forma de ludibriar o auditório, em função dos interesses do orador. Manipulação – uso indevido da argumentação com o intuito de levar os interlocutores a aderir acrítica e involuntariamente às propostas do orador.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Guião para o trabalho sobre René Descates


FILOSOFIA DO CONHECIMENTO.

Obras:
“Discurso do Método”  de René Descartes
"Breve História da Filosofia" de Roger Scruton

INVESTIGAÇÃO
1. Além dos capítulos referidos da obra dos autores leia também obras de História da Filosofia sobre René Descartes para documentar melhor o trabalho.
Na fotocopiadora será colocada uma obras de História da Filosofia com os capítulos a ler destacados por autor bem como a versão para fotocopiar das partes do "Discurso do Método"

OBJECTIVOS:
1. Resuma cada um dos capítulos. Os temas, as teses, os argumentos, os conceitos fundamentais.
2. Responda às questões colocadas.
3. Elabore uma definição de todos os conceitos chave.
4. Contextualize a obra na época: principais opositores, cultura da época.
5. Coloque em evidência as ideias do autor e a sua importância para a história da Filosofia.
7. Elabore uma pequena biografia de todos os filósofos cujo nome ocorra.
8. No final tente compreender quais os problemas filosóficos que tratou no seu trabalho.

Leituras e questões por Grupo:

GRUPO 1 (azul)


OBRA : O DISCURSO DO MÉTODO - INTRODUÇÃO


1. Qual a importância de Descartes para a história do conhecimento?
2. Quais os temas principais tratados no "Discurso do Método?
3. O que significa a expressão "Dúvida metódica"?


Grupo 2 - OBRA : O DISCURSO DO MÉTODO - 1ª PARTE


1. Quem e o quê critica Descartes no primeiro capítulo? Porquê?
2. Que se propõe fazer para atingir um conhecimento certo?
3. Qual o contexto filosófico/cultural e científico que motivou Descartes a escrever o Discurso do Método?


GRUPO 3 - OBRA : O DISCURSO DO MÉTODO - 2ª PARTE


1. Que tarefa se propõe Descartes levar a cabo? Para quê? (2ºCap)
2. Quais as regras do método que Descartes propõe? (2ºCap)
3. Qual a importância do método na procura do conhecimento?
4. Que modelo científico serve de inspiração à Filosofia cartesiana?





GRUPO 4 - OBRA : O DISCURSO DO MÉTODO - 4ª PARTE


1. No quarto capítulo Descartes conclui que há três ideias que são indubitáveis (certas). Quais são?
2. O que são ideias indubitáveis e como chega Descartes a essas ideias?
3. Como prova Descartes a existência de Deus? (4º Cap)
4. Qual a relação alma corpo?

Grupo 5 - OBRA : O DISCURSO DO MÉTODO - 6ª PARTE
1. Quais as razões para Descartes publicar " O Discurso do Método"?
2. O que tem que ter o conhecimento para poder ser seguro?
3. Qual a crítica à Filosofia antiga?


Grupo 6 - OBRA: BREVE HISTÓRIA DA FILOSOFIA MODERNA" Roger Scruton

1. Duvidar de quê e para quê?
2. Porque é Descartes um Filósofo racionalista?
3. Descartes considera que as ideias racionais/inatas são mais certas que as ideias da experiência. Como prova ele esta tese?
4. Quais os problemas filosóficos que Descartes tenta esclarecer?





Grupo de trabalho – 4 alunos

Apresentação por escrito – 8 páginas (Espaçamento 1,5 letra 11)
Apresentação oral: Cada grupo apresentará um capítulo.


Data de entrega do trabalho por escrito, (impresso em papel) 19 de Janeiro

Apresentações orais:

Grupo 1 e 2 – 19 Janeiro

Grupos 3 e 4- 20 ou 22 Janeiro

Grupo 5 e 6 – 26 Janeiro

Grupos 7 e 8 – 26 Janeiro

AVALIAÇÂO:

Escrito:
Compreensão e análise correcta do texto
Resposta correcta às questões
Investigação com vários recursos
Problematização oportuna dos temas filosóficos
Correcção da apresentação
Oral:
Interesse filosófico da exposição oral
Dinâmica de grupo
Domínio dos conteúdos - Cada aluno deverá falar (sem ler) no mínimo 5 m acerca do tema do seu trabalho.
Originalidade da apresentação
As obras estarão para fotocopiar na Reprografia.

BOM TRABALHO!

sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

A Crítica de Platão à Retórica.

Sócrates - Pois bem, vamos ver se consigo exprimir com mais clareza o meu pensamento. Digo que há duas realidades diferentes que correspondem a duas artes: à arte que se refere à alma chamo política; à que se refere ao corpo não posso atribuir uma designação só., mas, embora a cultura do corpo constitua uma unidade, distingo nela duas partes' a ginástica e a medicina. O que na política corresponde à ginástica é a legislação, o que nela corresponde à medicina é a justiça. Há, portanto, dois grupos de artes que se definem pelo seu objecto, de um lado a medicina e a ginástica, do outro a justiça e a legislação. Mas os elementos de cada grupo acusam também diferenças entre si. 

Da existência destas quatro artes, que visam o maior bem do corpo ou da alma, se apercebeu a adulação, não por meio de um conhecimento raciocinado, mas por via de conjectura, e, dividindo-se então em quatro partes e insinuando cada uma delas sob a arte correspondente, fez-se passar pela arte cujo disfarce adoptou. Não tem o mínimo interesse em procurar o que seja o melhor, mas, sempre por intermédio do prazer, persegue e ludibria os insensatos, que convence do seu altíssimo valor. assim que a cozinha toma a aparência da medicina, fingindo conhecer os alimentos que são melhores para o corpo, de tal maneira que, se coubesse a crianças, ou a homens tão pouco razoáveis como as crianças, decidir qual dos dois, médico ou cozinheiro, conhece melhor a qualidade boa ou má dos alimentos, o médico acabaria por morrer de fome.
 

A isto chamo eu adulação, que considero uma coisa vergonhosa, Polo (é a ti que neste momento me dirijo), porque visa o agradável sem a preocupação do melhor. E sustento que ela não é uma arte, mas uma actividade empírica, porque não tem na sua base um princípio racional que permita justificar as várias formas do seu procedimento no que respeita à sua natureza e às suas causas. Ora, eu não chamo arte a uma actividade que não esteja fundada na razão. Se tens algo a objectar ao que afirmo, estou pronto a fornecer explicações suplementares.
 

Portanto, repito, a cozinha é a adulação disfarçada de medicina. Da mesma maneira, à ginástica corresponde a
 toilette, prática malfazeja e enganadora, vil e indigna de um homem livre, que ilude com aparências, cores, cuidados da pele e do vestuário, a tal ponto que, interessadas em exibir uma beleza artificial, as pessoas descuram a beleza natural, proporcionada pela ginástica. 

Resumindo, dir-te-ei, em linguagem matemática (talvez assim me compreendas melhor), que a toilette está para a ginástica como a sofística para a legislação, e a cozinha para a medicina como a retórica para a justiça.
 

Sabes agora o que entendo por retórica: ela é em relação à alma aquilo que a cozinha é em relação ao corpo.
 


Platão, Górgias, 464

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

domingo, 22 de novembro de 2015

sábado, 21 de novembro de 2015

Breve História da Retórica.

Retórica e democracia

Não pode haver uma definição de retórica sem a referir à cultura grega, não só porque retórica é etimologicamente um termo grego, mas sobretudo porque a retórica constitui um dos traços fundamentais e distintivos do génio grego. O termo grego retoriké é afim aos termos retor (orador) e retoreia (discurso público, eloquência) e significa tanto a arte oratória como a disciplina que versa essa arte. Contudo, o sentido genuíno do termo ``retórica'' só se alcança quando se percebe como a civilização grega se distinguiu de todas as outras por assentar na palavra pública. Os gregos tinham consciência desse traço distintivo e enalteciam-no. Isócrates elogia Atenas por ser a cidade que descobriu a civilização assente nas palavras, e de saber retirar da capacidade da linguagem as consequências decorrentes dessa superioridade humana sobre todos os animais:
Foi a nossa cidade que revelou a cultura, que descobriu e organizou todas estas vantagens, que nos ensinou a agir e dulcificou as nossas relações, e que distinguiu entre as desgraças provocadas pela ignorância e pela necessidade, e ensinou a precavermo-nos contra aquelas e a suportar estas corajosamente. Foi ela que honrou a eloquência, que todos desejam, e cujos possuidores são invejados. Ela tem consciência de que somos, de todos os animais, os únicos que a natureza dotou deste privilégio e que, por termos esta superioridade, diferimos em tudo o mais; via que nas demais actividades a sorte é tão atrabiliária que é frequente que os inteligentes sejam mal sucedidos e os tolos prosperem, mas que os discursos belos e artísticos não são apanágio das pessoas inferiores, mas obra de uma alma que pensa bem; que os sábios e os que parecem ignorantes diferem uns dos outros sobretudo nisto, e ainda que os que foram criados desde início como homens livres não se conhecem pela coragem, riqueza ou qualidades dessa espécie, mas se distinguem sobretudo pela maneira de falar, e é este o sinal mais seguro da educação de cada um de nós, e aqueles que sabem usar bem da palavra, não só são poderosos no seu país, como honrados nos outros. (Panegírico, 47-49)2
Da faculdade específica do homem de falar e de, desse modo, tratar dos assuntos da cidade e dirimir os conflitos, extraíram os gregos a democracia, o regime político da maioria. O tirano ou os oligarcas mandavam pela força, na democracia o poder obtinha-se pela palavra convincente nas assembleias. Nada mais contrário ao espírito grego do que impor pela força o que deveria ser objecto de uma decisão maioritária, discutida previamente.3 O elogio que Péricles faz da constituição ateniense no discurso fúnebre aquando do enterro dos primeiros mortos na Guerra do Peloponeso, é ele mesmo uma lídima peça retórica sobre a organização política democrática, em que a direcção do Estado não se limita a poucos, mas se estende à maioria, onde há igualdade perante a lei, em que a diferença social, riqueza ou pobreza, não dá preferência nas honras públicas, sendo o único critério o mérito de cada um. Na cidade de homens livres as palavras são uma condição da actuação política. Veja-se este excerto do discurso de Péricles, onde marca a diferença de Atenas face a outras cidades gregas, nomeadamente Esparta:
Os mesmos indivíduos cuidam das questões familiares e das políticas, e a outros, aos que se dedicam aos seus ofícios, não falta um conhecimento suficiente dos assuntos públicos. Somos os únicos que entendemos que quem não compartilha destas preocupações não é indiferente, mas sim inútil, e por nós julgamos as questões públicas, ou pelo menos, estudamo-las convenientemente, não por pensarmos que as palavras prejudicam a acção, mas sim que é mais nocivo não ensinar primeiro pela discussão, antes de chegar o tempo de actuar. Diferentemente dos outros, temos ainda a norma de ousar o máximo mas reflectir profundamente sobre a empresa a que nos votamos. Enquanto que aos outros a ignorância traz a coragem, e o cálculo acarreta a hesitação.4
A ideia aqui exposta de que a retórica é traço do espírito democrático grego não contende, nem muito menos é posta em causa, como demonstrarei, com a lenda que remonta o início da retórica às disputas legais pela pertença de terras na Sicília nos primórdios do Século V antes de Cristo. Roland Barthes, por exemplo, descreve deste modo o surgimento da retórica:
A Retórica nasceu de processos de propriedade. Cerca de 485 a.C., dois tiranos sicilianos, Gelão e Hierão, efectuaram deportações, transferências de população e expropriações, para povoar Siracusa e lotear os mercenários; quando foram depostos por uma sublevação democrática e se quis voltar à ante qua, houve processos inumeráveis, pois os direitos de propriedade eram pouco claros. Estes processos eram de um novo tipo: mobilizavam grandes júris populares, diante dos quais, para os convencer, era necessário ``ser eloquente''. Esta eloquência, ao participar simultaneamente da democracia e da demagogia, do judicial e do político constituiu-se rapidamente em objecto de ensino. Os primeiros professores desta nova disciplina foram Empédocles de Agrigento, Corax, seu aluno de Siracusa (o primeiro que cobrava pelas suas lições), e Tísias.5
O próprio Barthes interpreta esta origem, a arte da palavra ligada a uma reivindicação de propriedade, vendo na retórica um cru instrumento de poder:
como se a linguagem, na sua qualidade de objecto de uma transformação e condição de uma prática, se tivesse determinado, não a partir de uma subtil mediação ideológica, mas a partir da socialidade mais nua, afirmada na sua brutalidade fundamental, a da possessão de terras: começámos a reflectir sobre a linguagem para defendermos os nossos bens.6
Olhando, sobretudo a partir da crítica de Platão à retórica, para esta leitura que Barthes faz da sua origem, poder-se-ia pensar que a retórica não passaria de uma técnica de domínio pela linguagem, extensível a qualquer actividade humana. Que essa foi, aliás, a compreensão e a aplicação que os sofistas fizeram da retórica, parece ainda mais reforçar a percepção da retórica como arte demagógica, aplicável tanto na democracia, como na tirania, ou em qualquer outro regime político. A retórica seria apenas um instrumento de persuasão dos outros, fosse para que fim fosse, de persuadir pela palavra os juízes no Tribunal, os senadores no Conselho, o povo na Assembleia, enfim os participantes de qualquer espécie de reunião política e, assim, com esse poder fazer seus escravos o médico e o professor de ginástica, e até o grande financeiro7
Mas a eventual origem forense da retórica não invalida de modo algum a concepção da retórica como expressão de uma mentalidade argumentativa e livre. O carácter agónico que existe entre as partes num tribunal distingue-se justamente por a decisão não decorrer da força bruta ou da violência de uma das partes, mas do poder dos argumentos aduzidos. Se algo diferencia a aplicação da justiça numa sociedade livre ou numa sociedade totalitária é justamente a possibilidade de qualquer das partes poder apresentar os seus argumentos e com eles influenciar a decisão do juiz, seja este um indivíduo ou um júri. Quem confia no uso da palavra para reclamar justiça não precisa de lançar mão de meios violentos.
O uso demagógico ou sofista da retórica não nega o carácter retórico da democracia e a íntima conexão entre liberdade política e discurso persuasivo. A má utilização que se pode fazer da retórica não significa de modo algum a negação da relação essencial entre retórica e democracia. E a razão fundamental desta relação é a liberdade do indivíduo suposta numa e noutra. Só tem sentido falar de retórica numa sociedade de homens livres e a democracia é o regime político por excelência dessa sociedade.
Num capítulo dedicado ao esplendor e miséria da retórica, Tzvetan Todorov, fixa muito bem a indissociabilidade entre democracia e retórica ao analisar a obra De Oratore de Cícero. 8
A democracia é a condição indispensável ao desenvolvimento da eloquência; reciprocamente, a eloquência é a qualidade superior do indivíduo que pertence a uma democracia: nenhum dos dois pode passar sem o outro. A eloquência é ``necessária'': eis o seu traço dominante, e, ao mesmo tempo, a explicação do seu sucesso.9
A crise da retórica surge quando se instala um poder forte, de direcção autoritária. Quando se instala o poder de um, monarca ou tirano, desaparece a eloquência. Todorov cita a seguinte passagem de Tácito:
Por que motivo se há-de defender uma opinião no Senado, se sabemos que a elite dos cidadãos concorda imediatamente com ela? Para quê reproduzir discursos diante do povo, se os interesses públicos não são deliberados por incompetentes, nem pela multidão, mas unicamente pelo mais sábio dos homens? ( Diálogo dos Oradores, XLI).10
É mediante a análise desta obra de Tácito, aliás, que Todorov traça a crise da retórica. O historiador romano criticava a eloquência, justamente por a associar a um regime democrático, de liberdade de discussão e de decisão. Considerava que um regime político que assentava na força da persuasão tinha um preço demasiado alto, a insegurança de cada cidadão. Tácito defendia um regime musculado, autoritário, onde a vida política não dependesse das capacidades persuasivas, mas sim da clarividência e da autoridade do poder instituído. A democracia, necessariamente fundada na eloquência, representava um risco para a sociedade.
Essa grande e gloriosa eloquência de outrora é filha do desregramento a que os tolos chamam liberdade (...); desconhecendo a obediência e a seriedade, obstinada, temerária e arrogante, ela não floresce nos Estados dotados de uma consituição. (...) Para a República, a eloquência dos Gracos não valia tanto como o peso das leis que faziam suportar, e a fama oratória de Cícero teve um preço demasiado alto para os fins conseguidos. ( Diálogo dos Oradores, XL) 11
Quão longe se encontra este entendimento de Tácito (55-120 p.C.), um historiador da época dos Césares, do entendimento de Isócrates (Séc. V-IV a.C.) sobre o que é uma constituição! Veja-se o que este retórico grego escreve sobre a antiga constituição de Atenas:
Os que naquele tempo administravam a cidade estabeleceram uma constituição que não era designada pelo nome mais comum e mais brando, mas que não se mostrava tal, pelos seus actos, àqueles que deparavam com ela, e que não educou os cidadãos de tal maneira que julgassem que era democracia a indisciplina, a liberdade o desprezo das leis, ou igualdade a licença de dizer tudo, ou bem-estar a permissão de proceder assim, mas essa constituição desprezava e castigava tais indivíduos, tornando todos os cidadãos melhores e mais sensatos. (Areopagítico, 20) 12
O espírito cesarista que enforma a crítica do romano Tácito à eloquência é o oposto do espírito democrático que anima o elogio do grego Péricles à constituição ateniense. Para o espírito prático de um romano, de privilegiar a acção em detrimento da palavra, o tempo consumido nas assembleias do povo no governo de Atenas não poderia deixar de ser visto como um desperdício de energias.

A retórica como discurso público

Retórica não pode ser confundida com outras formas de linguagem, nomeadamente a conversa. O que caracteriza a retórica nos gregos é ela pertencer à esfera política da vida de um cidadão, e não à sua vida privada. A distinção entre o político ou público e o privado é assim imprescindível para uma compreensão cabal da especificidade da retórica.
A vida política é a vida livre que o cidadão desenvolve enquanto membro participante e activo na condução dos negócios da polis. Distinta é a vida privada, a vida da família, dos escravos e dos animais domésticos, onde são satisfeitas as necessidades básicas como a alimentação e a reprodução, necessidades que não são distintas das dos animais. A organização familiar era uma imposição da natureza, tal como a organização em grupo de outras espécies de animais. Na esfera privada não há espaço para a liberdade, aí o chefe exerce um poder absoluto sobre mulheres e escravos. A polis demarcava-se do carácter familiar justamente por ser uma organização de iguais, onde não havia nem servos nem senhores.
Não é o viver em grupo, ou em sociedade, que caracteriza o homem dos outros animais. Hannah Arendt chama a atenção para a correcta tradução de zôon politikon não como animal social, mas como animal político. A sociabilidade é até um ponto em comum dos homens com os animais. O traço verdadeiramente distintivo é a natureza política do homem. A polis é como uma segunda vida, bios politikos, que só se realiza uma vez resolvidas as necessidades próprias da condição animal. Na vida privada o homem enfrenta as necessidades, na vida política ou pública o homem exerce a sua liberdade. Portanto, cada cidadão faz parte de dois tipos de vida, a que lhe é própria ( idion), e a que lhe é comum ( koinon). Tem a vida privada, a natural ou familiar, e a pública, a livre ou política. O ponto de união entre estas duas vidas é que a família satisfazia as condições de subsistência necessárias à vida de liberdade da polis13
A vida pública ou política era de certo modo um luxo que estava, portanto, reservado aos que podiam gozar de uma subsistência garantida. Mulheres, metecos e escravos não tinham uma vida política. E aqui coloca-se a questão sobre a abrangência da democracia ateniense. Com efeito, a partir dos números prováveis da população de Atenas em 430 a.C., 30.000 cidadãos, 120.000 familiares, 50.000 metecos e 100.000 escravos, verificamos que apenas 10% da população eram politai, cidadãos.14 A democracia ateniense era de algum modo uma aristocracia alargada.
Fustel de Coulanges dá-nos um retrato muito pormenorizado do dia a dia de um cidadão ateniense no gozo e cumprimento dos seus direitos e deveres políticos e vemos que é uma vida muito trabalhosa.
Espanta verificar todo o trabalho que esta democracia exigia dos homens. Era governo muito trabalhoso. Vejamos em que se passa a vida de qualquer ateniense. Determinado dia, o ateniense é chamado à assembleia do seu demo e tem de deliberar sobre os interesses religiosos ou financeiros dessa pequena associação. Um outro dia, este mesmo ateniense está convocado para a assembleia da sua tribo; trata-se de regular uma festa religiosa, ou de examinar as despesas, ou de fazer decretos, ou ainda de nomear chefes e juízes. Exactamente três vezes por mês torna-se preciso que assista à assembleia geral do povo, e não tem o direito de faltar. Mas a sessão é longa, porque o ateniense não vai à assembleia somente para votar. Chegado pela manhã, exige-se que o ateniense ali permaneça até hora avançada do dia a ouvir os oradores. Não pode votar senão tendo estado presente desde a abertura da assembleia, e tendo ouvido todos os discursos. (...) O dever do cidadão não se limitava a votar. Quando chegava a sua vez, também devia ser magistrado no seu demo ou na sua tribo. Em média, ano sim, ano não, era heliasta, isto é, juiz, passava todo esse ano nos tribunais, ocupado a ouvir os litigantes e a aplicar as leis. Quase não havia em Atenas cidadão que não fosse chamado duas vezes na sua vida a fazer parte do senado dos Quinhentos; então, durante um ano, todos os dias se sentava desde manha até à noite, recebendo os depoimentos dos magistrados, fazendo-os prestar as suas contas, respondendo aos embaixadores estrangeiros, redigindo as instruções dos embaixadores atenienses, examinando todos Os negócios que deviam ser submetidos ao povo, e preparando todos os decretos. Enfim, o ateniense podia ser magistrado da cidade, arconte, estratego, astínomo, quando a sorte ou o sufrágio o indicava. Vê-se quão pesado encargo era o de ser cidadão de qualquer Estado democrático, porque correspondia a ocupar em serviço da cidade quase toda a sua existência, pouco tempo lhe restando para os trabalhos pessoais e para a sua vida doméstica. Por isso, muito justamente, dizia Aristóteles não poder ser cidadão aquele homem que necessitasse de trabalhar para viver. Tantas eram as exigências da democracia. O cidadão, como o funcionário público de nossos dias, devia pertencer inteiramente ao Estado. Na guerra, dava-lhe o seu sangue; durante a paz, o sen tempo. Não era livre para descurar dos negócios públicos por se ocupar com mais cuidado dos seus próprios. Pelo contrário, devia descurar dos seus, para trabalhar em proveito da cidade. Os homens passavam a sua vida uns a governarem aos outros. A democracia não podia existir senão sob a condição de trabalho incessante para todos os seus cidadãos. Por pouco que afrouxasse, ela acabaria pouco a pouco por perecer ou por se corromper. 15
É neste dia a dia da vida política que o cidadão vive num mundo marcado pela eloquência ( léxis). As assembleias são palco de intensos debates. Todo o homem podia falar sem distinção de fortuna, nem de profissão, mas precisava de provar estar no gozo dos seus direitos políticos, não ser devedor ao Estado, ser de costumes puros, estar legitimamente casado, possuir bens de raiz na Ática, haver cumprido todos Os seus deveres para com seus pais, ter feito todas as expedições militares para as quais fora escolhido, e provar não ter deixado no campo, em nenhum combate, o seu escudo. 16
Uma vez tomadas estas precauções contra a eloquência, o povo abandonava-se-lhe em seguida inteiramente. Os atenienses como nos diz Tucídides, não acreditavam em que e palavra prejudicasse a acção. Sentiam, pelo contrário, a necessidade de se esclarecerem. A política já não era, como no regime precedente, negócio de tradição e de fé. Era preciso reflectir e ponderar sobre as razões. A discussão era indispensável, porque sendo toda a questão mais ou menos obscura, só a palavra podia iluminar a verdade, e povo ateniense queria que cada negócio lhe fosse apresentado sob todos os seus diferentes aspectos e lhe mostrassem claramente os prós e os contras. Considerava bastante os seus oradores; diz-se ter o costume de os recompensar em dinheiro por cada discurso pronunciado na tribuna. O povo fazia mais ainda: escutava-os; não podermos portanto apresentar este povo como multidão turbulenta ou barulhenta. Pelo contrário, a sua atitude era correctíssima; o poeta cómico apresenta-o escutando boquiaberto, imóvel nos seus bancos de pedra. Os historiadores e oradores descrevem-nos muito frequentemente estas reuniões populares; quase nunca os vemos a interromperem os oradores; quer esse orador seja Péricles, ou Cléon, Ésquino ou Dernóstenes, o povo continua atento; e, quer o lisonjeiem quer o repreendam, escuta. Deixa exprimir as mais opostas opiniões, com louvável paciência. Algumas vezes murmúrios, mas nunca gritos nem assuadas. O orador, diga o que disser, pode sempre chegar ao fim do seu discurso.17
Como se vê, retórica e democracia implicavam-se mutuamente e constituíam a esfera pública de Atenas.

António Fidalgo