segunda-feira, 16 de outubro de 2023

Texto para análise/resumo Miriam 11A e Melody 11I

 


O que é o ceticismo?

0 argumento que acabamos de examinar - o de que não conhecemos nada sobre o mundo que nos cerca - chama-se argumento cético. Os céticos sustentam que, na verdade, não sabemos o que pensamos que sabemos. E a afirmação de que não sabemos nada sobre o mundo que nos cerca chama-se ceticismo sobre o mundo exterior.

Ceticismo "versus" senso comum

A visão do senso comum, é claro, sustenta que de facto conhecemos o mundo exterior. Na verdade, se resolvesse dizer, "não sei se as árvores existem", especialmente se estivesse a olhar para uma árvore em plena luz do dia, os outros achariam que tinha enlouquecido.

Mas os céticos achariam que estava certo. Não sabemos se árvores existem. 0 senso comum está enganado.

Outros exemplos de enganos do senso comum

Os argumentos dos céticos podem deixar algumas pessoas muito irritadas. Sabermos que as árvores existem é uma das nossas crenças mais básicas - como costumo dizer, sentimos que é isso é apenas senso comum. Existem muitas crenças que abandonaríamos com muita satisfação, caso alguém conseguisse demonstrar que estamos errados. Mas, quando se trata das crenças mais arraigadas do nosso senso comum - como a crença de que sabemos que as árvores existem -, não ficamos nada satisfeitos por abandoná-las.

Na verdade, ter as nossas crenças mais elementares ameaçadas pode ser uma experiência bem desconfortável, especialmente quando não vemos como defendê-las. Nessas ocasiões muitos ficam enraivecidos. Dizem que é um disparate o que o filósofo está a dizer. "Isso é uma completa estupidez", gritam. "Claro que eu sei que as árvores existem." E retiram-se, ofendidos.

Mas o filósofo pode apontar que em muitos outros casos se comprovou que o senso comum estava errado. Por exemplo, noutros tempos, o senso comum afirmava que a Terra era plana. As pessoas simplesmente achavam que era óbvio que a Terra fosse plana. Afinal, parece plana, não parece? Os marinheiros até tinham medo de chegar ao fim da Terra e cair. Também nessa época algumas pessoas ficavam muito irritadas quando a  sua crença comum era desafiada. "Não seja ridículo", gritavam. "É claro que a Terra é plana." E saíam a bater os pés. Hoje, porém, sabemos que a Terra não é plana. 0 senso comum estava enganado.

O que os céticos NÃO afirmam

Vale a pena deixar claro o que os céticos não afirmam, para não ficarmos confusos. Em primeiro lugar, os céticos não afirmam saber que nós ou eles somos cérebros numa cuba. Só afirmam que ninguém pode saber de maneira alguma se alguém é um cérebro numa cuba.

Em segundo lugar, eles não afirmam apenas que não podemos ter a certeza absoluta de que o mundo que vemos é real ou virtual. Afirmam muito mais do que isso. Afirmam que não temos razão alguma para acreditar que o mundo que vemos é real e não virtual.

Em terceiro lugar, eles não vão tão longe a ponto de afirmar que ninguém pode saber nada. Afinal, eles próprios reivindicam saber uma coisa: que ninguém pode conhecer o mundo exterior.

 Um enigma antigo

Estamos então diante de um enigma difícil. Por um lado, a visão do senso comum é que sabemos que as árvores existem. Nós não queremos de facto abrir mão dessa visão do senso comum (na verdade, nem estou certo de que poderíamos abrir mão dela mesmo que quiséssemos). Por outro, o cético tem um argumento que parece mostrar que a nossa visão do senso comum está errada: nós não sabemos que as árvores existem. Qual das visões está certa?

Apesar da roupagem moderna que eu lhe dei, este enigma é na verdade bem antigo. É de facto um dos enigmas filosóficos melhor conhecidos. Ainda hoje, nas universidades do mundo inteiro, os filósofos se debruçam sobre ele. E ainda não conseguiram decidir se os céticos têm razão. Eu devo admitir: não sei se os céticos têm ou não razão. Ao longo dos séculos, muitos filósofos tentaram lidar com o ceticismo. Procuraram demonstrar que o senso comum está certo: nós conhecemos efetivamente afinal o mundo que nos cerca. Algumas das suas tentativas para derrotar os céticos são muito perspicazes. Mas será que alguma delas funciona mesmo? Examinemos agora uma dessas tentativas.

 Stephen Law, Os Arquivos Filosóficos (São Paulo, 2003, págs. 60-69). 

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