O triângulo arte- religião - ciência, apesar de ter vértices bem
definidos (a arte ligada à emoção, a religião à revelação e a ciência à
razão), tem lados mal definidos: pode-se ir de um para outro vértice por
um ou por outro caminho. Os vértices comunicam entre si de várias
maneiras. Õ físico Albert Einstein compreendeu a unidade e virtuosidade
desse triângulo, quando escreveu: “Todas
as religiões, artes e ciências são ramos da mesma árvore. Todas elas
são aspirações direccionadas ao enobrecimento da vida humana, elevando-a
acima da esfera dam era existência física e conduzindo o indivíduo a um
estado de maior liberdade”.
Vejamos em primeiro lugar o
caminho que vai da religião para a arte ou vice-versa. São profundas as
relações entre religião e arte. Basta tomar, por exemplo, a
arquitectura: as catedrais são obras de arte que, na feliz expressão de
um outro físico de ascendência judaica, tal como Einstein, Julius Robert
Oppenheimer, pretendem “fazer chegar as torres até à altura de Deus, enquanto as portas permanecem da altura dos homens”.
Será
preciso ter fé para projectar um tempo? A história da arquitectura
mostra que não. Se há arquitectos extremamente crentes como Antoni
Gaudí, autor da Igreja da Sagrada Família em Barcelona (um grupo de seus
admiradores está a tentar até a sua beatificação e, se o conseguir,
será a primeira vez que um arquitecto se torna beato), outros há que são
ateus como Le Corbusier e Oscar Niemeyer (disse este arquitecto
brasileiro: “Não acredito em nada. Acredito na Natureza: tudo começou não se sabe quando nem como. Eu bem que gostaria de acreditar em Deus".)
Mas isso não impede que a religião tenha uma forte influência na arte.
O arquitecto Daniel Libeskind (também judeu tal como Einstein e
Oppenheimer), quando interrogado sobre o papel da arquitectura na
religião, afirmou: "O primeiro nome
que vem à mente é, obviamente, Antoni Gaudí. Mas em alguns aspectos, é
demasiado óbvio. Eu sempre me fascinei com a inescapável
espiritualidade de uma pessoa considerada um herege, como Le Corbusier,
ou um místico, como Mies van de Rohe, que lêem São Tomás e Santo
Agostinho e têm os seus livros na cabeceira. Gostaria de concluir
dizendo que não houve um grande arquitecto, que não tenha tido um forte elemento de espiritualidade".
Com efeito, o ateísmo de Le Corbusier não o impediu de construir a bela, embora estranha, Chapelle de Notre Dame du Haut, em Ronchamp, assim como o Convento Dominicano de La Tourette, perto de Lyon. Por sua vez, o ateísmo de Niemeyer não
o impediu de construir a bela igrejas como a de S. Francisco de Assis,
em Belo Horizonte. As opções estéticas são individuais. Ao contrário de
Le Corbusier e de algum modo à semelhança de Gaudi, Niemeyer privilegia a
linha curva em relação à recta, invocando a ciência: "Não
é o ângulo recto que me atrai, nem a linha recta, dura, inflexível,
criada pelo homem. O que me atrai é a curva livre e sensual, a curva que
encontro nas montanhas do meu
país. No curso sinuoso dos seus rios, nas ondas do mar, no corpo da
mulher preferida. De curvas é feito todo o universo, o universo curvo de
Einstein."
Carlos Fiolhais
Retirado daqui
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