Victor Hugo Silva
“A fé e a razão são como que as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade (…)” (João Paulo II).
O homem frequentemente foi visto de uma
forma paradoxal, dual. Ora é visto somente pelo viés da alma, ora pelo
viés corporal. Dentro desta imagem – a dual – encontra-se, também, o
homem no paradigma epistemológico, ou seja, ora ele se apura pelo
empirismo, no qual a primazia encontra-se no objeto, ou constitui-se
pelo racionalismo, tendo por vez a soberania do sujeito. Sinteticamente,
podemos afirmar que o homem é unidade substancial ou constitui-se
separadamente?
Tais questões, elencadas acima,
precederam o pensamento pascaliano e o ajudaram na formulação de seu
pensamento antropológico. O quesito dualidade assume dentro de seu
pensamento o principal caminho para se chegar à compreensão do que seja o
homem e o que lhe compete após descobrir sua situação ontológica.
Numa relação estrita com o pensamento
cristão, Pascal verá o homem, também, de uma forma dual. Ele – o homem –
está entre a grandeza e a miséria de seu ser, que Pascal chamará de
contradição. Devido ao pecado original, o homem decaído não possui a
plenitude ontológica, pois, esta se dá na comunhão com Deus. Devido à
desobediência – causa do pecado original – o homem afasta-se de Deus. A
auto-suficiência toma lugar do Ser que lhe constitui. No entanto, “o
homem sente-se só e perdido, pois não mais percebe os vestígios do
Criador” (ZILLES, 1991, p.36). O homem já não pode compreender-se, pois
afasta-se do criador, obtendo como resultado a perda do paradigma
absoluto do seu auto-conhecer. Perdendo esta comunhão com Deus, o homem
se torna incapaz, por si mesmo de deliberar bem, ou seja, de agir
justamente. “O homem de Pascal encontra-se numa situação que alguns
intérpretes caracterizam a luz da categoria do Trágico” (VAZ, 1991,
p.30).
Nisto consistir-se-á que “o homem não é apenas injusto,
pelos seus pensamentos e ações; a injustiça, tornada constitutiva,
aparece como aquilo que condiciona a sua própria natureza, enquanto
corrompida” (LEOPOLDO, 2001, p.29). Portanto, aqui chegamos ao ponto
central de nossa reflexão: com o distanciamento do homem de Deus, ele
reconhecerá somente sua condição de ‘grandeza’ (aparente), deixando de
lado o reconhecimento de sua miséria. Pois, quando absolutizamos a
razão, nos tornamos inábeis a perceber nossa situação miserável e isto
nos impossibilita de pensar algo além que nos constitui. É neste
movimento que a razão decai, pois ela terá como auto-refletor, somente a
si mesmo. Justamente, é isto que Pascal está tentando resgatar em sua
obra Pensées ou Apologia da Religião Cristã, ou seja, mostrar o caminho
de uma reta razão baseada nos parâmetros da fé e da religião cristã.
Para isso, Pascal definiu o papel da razão:
A última tentativa da razão [é descobrir] que há uma infinidade de coisas que a ultrapassam. Revelar-se-á fraca se não reconhecer isto. É preciso saber duvidar aonde é preciso, afirmar aonde é preciso. Quem não faz assim não entende a força da razão (PASCAL, 1999, p. 55).
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