Joaquin Sorolla, Estudo sobre o mar, Valencia, 1904
Tales
tentou compreender o mundo sem invocar a intervenção dos deuses. Como os babilónicos,
acreditava que o mundo já tinha sido água. Para explicar a terra seca, os
babilónicos diziam que Marduk tinha colocado uma esteira na face das águas e
amontoado areia sobre ela. Sim, tudo tinha sido água, mas a Terra surgiu dos
oceanos por um processo natural, similar, ele julgava, à obstrução que tinha observado
no delta do Nilo. Pensava realmente que a água era um princípio comum
subjacente a toda matéria, assim como hoje em dia dizemos o mesmo de eletrões,
protões e neutrões, ou dos quarks. Se a conclusão de Tales estava ou não correta
não importa, mas sim o seu lema: o mundo não era governado pelos deuses, mas
sim pelo trabalho das forças materiais interagindo com a Natureza. Tales trouxe
da Babilónia e do Egito as sementes das novas ciências, astronomia e geometria;
ciências que germinaram e cresceram no solo fértil da Jónia. Muito pouco se
sabe da vida pessoal de Tales, mas Aristóteles narra uma anedota reveladora na
sua obra Política: [Tales] era
censurado pela sua pobreza, que se supunha ser prova de que sua filosofia não
tinha utilidade. De acordo com a história, sabia pela sua perícia [em
interpretar os céus], enquanto ainda era inverno, que haveria uma grande
colheita de azeitonas no ano seguinte, de modo que, tendo pouco dinheiro, fazia
depósitos pelo uso das prensas de azeitonas em Quio e Mileto, as quais alugava
a preços baixos porque ninguém lhe dava ouvidos. Quando chegava a colheita, e
havia necessidade de muitas, cedia-as ao preço que lhe convinha e ganhava uma
boa quantia de dinheiro. Assim provava que os filósofos do mundo podiam
facilmente ficar ricos se quisessem, mas que a sua ambição era outra. Era
famoso como sábio político, incitando com sucesso os Milesianos a resistir à
assimilação por Creso, Rei da Lídia, mas não foi feliz ao apelar a uma
federação de todos os estados insulares da Jónia contra os Lídios. Anaximandro
de Mileto era amigo e colega de Tales, um dos primeiros, que se tem
conhecimento, a fazer experiências. Examinando o movimento de uma sombra
lançada por uma vareta vertical, determinou com precisão a duração do ano e das
estações. Por anos os homens utilizaram varetas para lutar ou matar.
Anaximandro utilizou-as para medir o tempo. Foi a primeira pessoa na Grécia a
fazer um relógio de sol; um mapa do mundo conhecido e um globo celeste que
mostrava os traços das constelações. Acreditava que o Sol, a Lua e as estrelas
eram feitos de fogo vistos através de buracos que se moviam na abóbada do céu,
provavelmente uma ideia bem mais antiga. Sustentou a opinião admirável de que a
Terra não era suspensa ou sustentada mas, para ele, era o centro do universo;
uma vez sendo equidistante de todos os pontos da "esfera celeste" não
havia força capaz de movê-la. Argumentava que somos tão desamparados ao nascer,
que se os primeiros bebés fossem colocados no mundo e deixados a sós, talvez
morressem de imediato. Partindo daí, Anaximandro concluía que os seres humanos
surgiram de outros animais com recém-nascidos mais capazes. Propôs a geração
espontânea da vida na lama, os primeiros animais tinham sido peixes cobertos
por espinhos. Alguns descendentes desses peixes abandonaram eventualmente a
água e dirigiram-se para a terra seca, onde evoluíram para outros animais por
transmutação de um tipo para outro. Acreditou num número infinito de mundos,
todos habitados e sujeitos a ciclos de dissolução e regeneração. "Nem
ele", queixou-se lamentavelmente Santo Agostinho, "nem Tales
atribuíram a causa de toda esta atividade sem fim a uma mente divina."
Carl Sagan, Cosmos,
A história da Filosofia parece ser a história do tempo em que os professores nas suas aulas ainda se interessavam por este percurso de ensinar a forma como a filosofia surgiu. A questão da origem foi progressiva e inexoravelmente substituída pela noção de causa. A questão histórica substituída pela questão estrutural da linguagem e assim se foi perdendo como sendo displicente. O argumento era sempre o mesmo, o velhinho e gasto argumento de Kant de que se pode ensinar História da Filosofia mas que História não é Filosofia e que só se aprende Filosofia filosofando. Bom, poderia para rebater Kant, usar B. Russell como quem usa uma colher para comer esparguetti, diz ele, e desculpem-me se pareço subtilmente superficial em matérias tão sérias, diz ele, repito, que sem História não há progresso na Filosofia pois os filósofos não saberiam de que modo os antigos filósofos argumentaram e resolveram as questões e cairiam facilmente nos erros já cometidos por eles.
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